TUTELA PROVISÓRIA (NO NOVO CPC) E O PROCESSO DO TRABALHO

INTERIM PROTECTION (IN THE NEW CODE OF CIVIL PROCEDURE) AND THE WORK PROCESS

Rodolfo Pamplona Filho

Professor Titular do Curso de Direito e do Mestrado em Direito, Governança e Políticas Públicas da UNIFACS - Universidade Salvador e Professor Associado I da Graduação e Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado e Doutorado) da UFBA - Universidade Federal da Bahia. Coordenador dos Cursos de Pós-Graduação em Direito Civil e em Direito e Processo do Trabalho da Faculdade Baiana de Direito desde 2013. Coordenador dos Cursos de Pós-Graduação online em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Contratual da Estácio, em parceria tecnológica com o CERS, desde 2016. Possui Graduação em Direito pela Universidade Federal da Bahia (1994), Mestrado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1997), Mestrado em Direito Social pela UCLM - Universidad de Castilla-La Mancha (2012) e Doutorado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2000). Presidente Honorário da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Presidente da Academia de Letras Jurídicas da Bahia, Presidente do Instituto Baiano de Direito do Trabalho, membro da Academia Brasileira de Direito Civil (ABDC), do Instituto Brasileiro de Direito Civil (IBDCivil) e do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam). Juiz do Trabalho em Salvador/BA.

Tercio Roberto Peixoto Souza

Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador (2003) e Mestre em Direito Privado e Econômico pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. Atualmente é Procurador do Município de Salvador/BA e sócio de Sampaio e Souza Advogado. Membro do IAB - Instituto dos Advogados da Bahia, atuando principalmente nos seguintes temas: Direito do Trabalho e Processo de Trabalho.

Resumo: O Novo Código de Processo Civil reestruturou de forma significativa a prestação jurisdicional cautelar e de urgência, cabendo-nos, neste texto, pontuar as principais repercussões de tais mudanças no âmbito do Processo do Trabalho.

Palavras-chave: Tutela provisória. Novo CPC. Processo de trabalho.

Abstract: The new Code of Civil Procedure has significantly restructured the judicial and emergency judicial service, and it is the responsibility of this text to note the main repercussions of such changes in the scope of the Labor Process.

Keywords: Interim protection. New CPC. Work process.

1.  Introdução

De um lado, a vida cotidiana exige soluções rápidas e simplificadas, por vezes incompatíveis com a complexidade das relações sociais. De outro lado, a relação processual, mormente no tocante às questões relacionadas às relações de trabalho, demanda essencialmente, um iter, um período inato à sua materialização.

Existe muita preocupação com o tempo do processo. Se de um lado, sabe-se que é inerente à lógica processual conceder às partes uma oportunidade para deduzir o que entender de direito, de outro buscam-se mecanismos para evitar que o processo seja uma marcha sem fim. A própria noção da razoável duração do processo, encartado no inciso LXXVIII do art. 5º da CF/88, positiva a relevância do tema e a preocupação de todos quanto ao momento da prestação jurisdicional. Nesse contexto, coube ao Novo Código de Processo civil reestruturar de forma significativa a tutela jurisdicional de urgência e de evidência, visando equacionar o difícil dilema entre o prazo inerente ao processo e a necessidade de tutelar de forma tempestiva o direito de quem o tem.

Se a questão encontra alguns dilemas no âmbito do Processo Civil, no tocante à dinâmica dos processos laborais tais contornos ganham ares de dramaticidade. A omissão da CLT sobre o tema aliada às novidades impostas pelo novo sistema processual demandam a análise de tais mudanças, as quais são essenciais à adequada compreensão dos institutos, inclusive para que se apure a sua possível aplicação ao Processo do Trabalho. É o que cabe nestas linhas.

2.  Da tutela jurisdicional, do tempo e da eficácia da decisão

Não há novidade alguma em se reconhecer que o Estado avocou para si a possibilidade de distribuir a Justiça, impedindo o exercício arbitrário da força privada, bem como que a atividade judicial se exercita por intermédio de diversos atos, praticados ao longo do processo.

De longa data (MIRANDA, 1998) se reconhece que

[...] desde que o Estado eliminou e proibiu a justiça de mão própria, monopolizando a distribuição da justiça, salvo pouquíssimas exceções àquela eliminação ou a este monopólio (e.g., arbitragem), tinha de prometer e assegurar a proteção dos que precisassem de justiça, isto é, prometer e assegurar a pretensão à tutela jurídica. Toda técnica legislativa, administrativa e judiciária se empenha no cumprimento desse propósito. Com isso, o Estado realiza o direito objetivo e pacifica. O Poder Judiciário foi criado para isso e o processo judiciário tem por fim organizar a provocação e a prestação da justiça. (p. 244).

O processo judiciário tem por finalidade justamente a organização da provocação e prestação de justiça. É puro método para a resolução de conflitos. Ou, nas precisas palavras de Pontes de Miranda (1998, p. 246), “[...] o processo não é mais do que o corretivo da imperfeita realização automática do direito objetivo”.

Tal método não é desprovido de valores éticos, todavia. O processo está afetado à satisfação das necessidades daqueles que reclamam a própria Justiça. O mesmo constitui instrumento para a tutela do direito substancial e está a serviço desse, para garantir sua efetividade. Nesse contexto, luminosas são as considerações de José Roberto dos Santos Bedaque (2011, p. 26), para quem:

Talvez a noção mais importante do direito processual moderno seja a de instrumentalidade, no sentido de que o processo constitui instrumento para a tutela do direito substancial. Está a serviço deste, para garantir sua efetividade. A consequência dessa premissa é a necessidade de adequação e adaptação do instrumento ao seu objeto. O processo é um instrumento, e, como tal, deve-se adequar-se ao objeto com que opera. Suas regras técnicas devem ser adaptar a servir ao fim a que se destinam, motivo pelo qual se pode afirmar ser relativa a autonomia do direito processual. [...] Por isso, o direito processual deve adaptar-se às necessidades específicas do seu objeto, apresentando formas de tutela e de procedimento adequadas às situações de vantagem asseguradas pela norma substancial. A partir do momento em que se afirma o caráter instrumental do processo, deve ser abandonada qualquer ideia fundada na neutralidade da ciência processual.

De outro lado, o tempo é elemento fundamental à entrega de qualquer tutela. Em verdade, é daqueles males necessários à própria prestação jurisdicional, considerando-se a necessidade, inerente ao processo, de ouvir a outra parte e mesmo a de o juízo formar o seu convencimento. Por sua vez, não se ignora seus efeitos deletérios, tampouco a possibilidade não apenas do perecimento do bem da vida entre a propositura da demanda e a sua conclusão, mas também da configuração de manifesta injustiça na submissão de uma das partes a todo o iter processual, quando a defesa da outra é eminentemente inconsistente, apenas ditada pela necessidade do cumprimento das inúmeras etapas definidas pela própria Lei.

Dessa forma, o cumprimento das etapas e formalidades processuais poderia vir a se tornar não meio de confirmação da justiça, mas objeção à própria prestação jurisdicional. Daí porque, segundo lecionam Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria e Paula Sarno (2015), o tormento do processualista contemporâneo é justamente a gestão do tempo para a efetivação da tutela jurisdicional, seja na observância do fator “demora irrazoável” - o abuso do tempo -, seja na razoabilidade de quem arcará com os ônus do passar do tempo para a concessão da tutela definitiva.

Se tal realidade se afirma em relação ao Direito Processual Civil dito comum, com muito mais razão deve ser aplicada ao Direito Processual Trabalhista, na medida em que implementa direitos fundamentais, essencialmente.

Neste ponto, interessante notar que o procedimento atinente à prestação jurisdicional no âmbito das relações do trabalho buscou ser estruturado a partir da noção da necessária imediatidade na concessão da tutela (definitiva). Seguindo o rigor legal, uma vez proposta a demanda, e após citado o réu (em apenas 5 [cinco] dias), ter-se-ia uma audiência com a tentativa de composição, instrução e julgamento na própria assentada (arts. 844-850, CLT), sendo esse o desejo do legislador. Talvez se pudesse justificar, justamente a partir dessa sumariedade, por assim dizer, do procedimento usual nas demandas laborais, ter sido o legislador, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e demais dispositivos legais aplicáveis, extremamente econômico em disciplinar a dinâmica das concessões de tutela, diga-se não-definitivas, no âmbito das relações de trabalho, o que poderia dar azo a indagações quanto ao cabimento da tutela provisória no âmbito do processo laboral.

De todo modo, para este momento, parece ser elementar expor que o processo é apenas meio para que se alcance a necessária justiça, mediante a decisão judicial. E mesmo assim deve-se reconhecer a necessária distinção entre a tutela jurídica e a atividade jurisdicional. Deve-se diferenciar (PASSOS, 2016, p. 163)

[...] o meio (processo) do resultado que ele busca alcançar (atribuição de um bem da vida - mérito), do que resulta a necessidade também de se distinguir a atividade jurisdicional, relacionada com o processo, e a tutela, jurídica, que diz com o mérito, ou seja, com a atribuição de alguém de determinado bem da vida, porque assim disposto pela ordem jurídica.

Ainda, cumpre mencionar que o Código de Processo Civil de 1973 estava organizado no sentido de que a jurisdição seria realizada mediante processo de conhecimento (Livro I), de execução (Livro II), cautelar (Livro III) e procedimentos especiais (Livro IV), como se depreende da redação do art. 270 do CPC-73. Enquanto cabia, no processo de conhecimento, a tutela jurisdicional voltada à certificação do direito (por meio das ações e processos de cognição), no processo de execução caberia à tutela o papel de impor a sua atuação, se já certificado, enquanto no âmbito das providências cautelares, cabia à tutela jurisdicional assegurar e garantir o curso eficaz e o resultado útil das outras duas.

A tutela jurisdicional definitiva, assim sendo, estava voltada a satisfazer a pretensão, fosse mediante a certificação (processo de conhecimento) ou a efetivação (processo executivo), de um lado, ou, do outro, mesmo que não satisfativa, a noção de assegurar, cautelar, a própria pretensão principal (processo cautelar). E tal premissa não muda, consoante se depreende do conteúdo do art. 309, parágrafo único, do NCPC.

Por sua vez, diversas foram as modificações da organização originária do Código de Processo Civil revogado, sobre as quais não cabe aqui se discorrer, bastando que se reconheça, para o momento, que o advento do NCPC promoveu uma alteração sistêmica relevante, eliminando a previsão de um processo específico para o exercício da pretensão cautelar, destinado a prestar, tão somente, a tutela cautelar. Doravante, ao longo de toda a prestação jurisdicional poder-se-á adotar as medidas necessárias para assegurar o resultado útil do processo.

De outro lado, além da mera hipótese de cautela, reafirmou-se a possibilidade de ser deferida a tutela em face daquele cuja defesa seja inconsistente. Então, pode-se apontar que fora estruturada, no CPC-2015, a tutela provisória em duas perspectivas bem delineadas, quais sejam, a denominada tutela de urgência e a denominada tutela de evidência, ambas aplicáveis ao processo laboral, embora sujeitas a alguns ajustes na sua implementação, em face da omissão da legislação trabalhista, no particular. Veja-se.

3.  Das noções gerais da tutela provisória: da tutela de urgência (antecipada e cautelar) e da tutela da evidência

Como é sabido, não inova a compreensão de que a prestação jurisdicional permite a utilização de meios a assegurar o processo, assegurar o próprio bem da vida ou, ainda, a fruição do bem da vida antes de encerrada a demanda, por meio da sentença, cabendo uma compreensão dos aludidos mecanismos, além das suas eventuais peculiaridades em relação ao processo do trabalho.

Existem situações de urgência em que o tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva pode ensejar verdadeiro risco para as partes. De outro lado, existem hipóteses em que a evidência do quanto deduzido impõe que o tempo do processo não deve ser suportado pelo titular do direito lastreado em uma “certeza razoável”.

O NCPC, a partir dos arts. 294 e seguintes, aplicável ao processo laboral (arts. 15, NCPC e 769, CLT), reafirma a noção de que é possível a concessão da tutela jurisdicional, ainda que provisória - gênero que engloba duas espécies, a tutela de urgência (que pode ser antecipada ou cautelar) e a tutela de evidência -, embora ambas, justamente por serem meramente provisórias, sejam substituídas por uma tutela definitiva, que as confirme, revogue ou modifique (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015).

A decisão provisória conserva a sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada (art. 296, NCPC). Ou seja, a tutela provisória não se presta à estabilização por meio da coisa julgada. Tal transitoriedade, portanto, dá a marca ao aludido provimento jurisdicional, na medida em que a revogabilidade e a modificabilidade da decisão proferida acabam por caracterizar a denominada tutela provisória.

Por sua vez, a decisão que defere a tutela provisória está sujeita à fundamentação (art. 298, NCPC). Mas é relevante identificar que, não obstante a previsão legal exija a fundamentação, é da essência da tutela provisória justamente a sumariedade da cognição (análise superficial ou de plano) do objeto litigioso.

A sumariedade da tutela provisória é contraposta pela cognição dita “exauriente”, formada a partir do exercício do pleno contraditório. A sumariedade da cognição judicial é exercida pelo juiz por força da plausibilidade do direito pretendido, cujo contraditório será exercido integralmente apenas depois (contraditório diferido), ou por força da conjugação da plausibilidade do direito com o perigo da demora correspondente. A sumariedade da análise, portanto, é também uma marca dessa espécie de tutela.

Ao deferir a tutela provisória, o juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para sua efetivação (art. 297, NCPC), expressão legal que o autoriza a utilizar um sem número de medidas, desde que adequadas à garantia pretendida.

Também é importante mencionar que será competente para conhecer do pedido de tutela provisória o juízo da causa e, quando antecedente, o juízo competente para conhecer do pedido principal (art. 299, NCPC), previsões absolutamente aplicáveis ao processo laboral.

3.1.    Da tutela de urgência (antecipada e cautelar)

As tutelas de urgência são provisórias, revogáveis e autônomas em relação ao objeto principal da tutela jurisdicional (certificação do direito). Por sua vez, a tutela (provisória) de urgência pode ser compreendida enquanto cautelar ou antecipada.

A tutela de urgência cautelar, além das características mencionadas, tem em vista assegurar o resultado útil do processo, acessório, portanto, da pretensão principal (processual). A tutela de urgência cautelar, nesse sentido, é meramente instrumental ao próprio processo.

Já a tutela de urgência antecipada visa assegurar a efetivação do bem da vida pretendido (visa resguardar o direito material envolvido).

É importante identificar que se exige, para a concessão da tutela de urgência, a demonstração da probabilidade do direito pretendido, cumulada com o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300, NCPC).

Veja-se que o aludido dispositivo exige, portanto, para a concessão da medida de urgência, não apenas que seja demonstrada a existência do direito, a que usualmente se refere como sendo a “fumaça do bom direito”, mas que também o seja o “perigo da demora”, a título de “antecipação de tutela”, denominação corriqueiramente utilizada para indicar a necessidade de que a medida seja tomada imediatamente, sob pena do perecimento do próprio direito.

Enquadrar-se-ia nesse cenário a hipótese da concessão de medida antecipatória visando resguardar a manutenção do vínculo de emprego do empregado estável, eventualmente ameaçado de despedida, para que o próprio direito ao contrato de trabalho (estabilidade) não pereça, por exemplo.

Além dessas possibilidades, o mesmo dispositivo assegura que a tutela de urgência será concedida ainda em outra hipótese, aquela em que se pretende assegurar o resultado útil do processo (cautelar).

Trata-se da hipótese do bloqueio de ativos do réu que dilapida o seu patrimônio deliberadamente, a fim de frustrar a satisfação da execução trabalhista. Nesse caso, visa-se precipuamente preservar a utilidade da prestação jurisdicional (executiva). Isso porque o próprio legislador consignou que a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito (art. 301, NCPC).

Justamente por isso é que se verifica imperioso demonstrar ou a urgência (art. 300, NCPC), ou a evidência (art. 311, NCPC) ou ambas para a concessão da tutela de urgência, embora a concessão da tutela cautelar somente tenha vez se demonstrada a urgência, dado que é própria dessa modalidade de tutela (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015).

De outro lado, a fim de assegurar os ônus decorrentes da concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la (§ 1o do art. 300 do NCPC).

A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia, ou seja, após ouvido o requerente, e mesmo antes de apresentada a defesa pelo demandado (§ 2º do art. 300 do NCPC).

Por fim, exige a lei que a tutela de urgência de natureza antecipada não seja concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (§ 3o do art. 300 do NCPC).

A irreversibilidade dos efeitos da decisão é elemento importante para a não concessão da tutela antecipada, e reafirma o conteúdo do revogado art. 273 do CPC-73 e o entendimento firmado pelos Tribunais. Veja-se:

[...] II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA Para a concessão da tutela antecipatória das obrigações de fazer e não fazer, necessário faz-se o preenchimento de seus requisitos autorizadores, quais sejam, a verossimilhança do direito alegado, a reversibilidade da medida e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273 do CPC), o que não ocorreu no caso. [...] (TST. ARR: 88600-72-2012-5-17-0003, Data de Julgamento: 11/02/2015, Data de Publicação: DEJT 20/02/2015)

Na hipótese de revertida da tutela antecipada, a parte responderá pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, nos próprios autos em que deferida a antecipação de tutela, sempre que possível, se presentes as hipóteses previstas no art. 302 do NCPC:

I - a sentença lhe for desfavorável;

II - obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias;

III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal;

IV - o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor.

Tais medidas exigem, assim, que a parte seja responsável ao pleitear a antecipação da prestação jurisdicional, sob pena de ser obrigada a arcar com a restituição da coisa ao status quo ante, ou a indenização correspondente.

Por sua vez, é preciso compreender, ainda, que a tutela de urgência pode ser requerida em caráter antecedente (antes da pretensão principal) ou incidentalmente (no curso da demanda principal).

3.1.1.   Da tutela de urgência antecipada antecedente

Embora a tutela provisória de evidência somente possa ser formulada incidentalmente, a tutela de urgência pode ser requerida tanto em caráter antecedente como incidentalmente.

Os arts. 303 e seguintes do NCPC disciplinam o procedimento para a tutela provisória em caráter antecedente, ou seja, antes da demanda principal, nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação.

Nesse caso, emergem duas possibilidades conferidas ao autor, cuja opção exercida deverá constar expressamente em sua petição inicial (§ 5º).

Ou o autor, em sua petição inicial, limita-se ao requerimento da tutela antecipada (satisfativa) e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo (art. 303), ou formula o pedido provisório urgente antecedente, cumulado com a tutela satisfativa final.

A última hipótese poderia ser encarada como o que exemplificativamente ocorre quando, apresentada a pretensão principal, a parte formula pedido de antecipação da tutela sem a oitiva do demandado, ou seja, liminarmente, cumulado com outros pedidos. Mas a demanda seguirá o seu curso normal, depois de apreciado o pedido, com o prosseguimento do feito, apresentada a contestação, etc.

De outro lado, na primeira hipótese do art. 303, seguir-se-á o critério de que se faculta à parte autora, na condição de pretender uma antecipação de tutela (satisfativa) apenas, que formule a sua pretensão provisória, e que apresente qual seria a sua eventual pretensão “ao fim e ao cabo”, formulando apenas o pedido de tutela provisória, com uma exposição sumária da causa de pedir, do direito que pretende realizar e do perigo de dano.

Seria a hipótese, por exemplo, em que o trabalhador fosse preavisado do rompimento do seu vínculo de emprego, embora portador de estabilidade convencional, e visasse resguardá-lo, bastando-lhe formular exclusivamente o pedido de manutenção do vínculo de emprego, a título de tutela antecipada.

O art. 303 do NCPC faculta ao autor formular o pedido de tutela provisória (satisfativa) antecedente, buscando exclusivamente que lhe seja assegurada a aludida estabilidade no emprego, por meio de petição inicial “simplificada” contendo apenas os elementos básicos para que o juízo se convença da tutela pretendida (TEIXEIRA FILHO, 2015).

Deferida a tutela antecipada, e formulado o pedido simplificado, o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final em 15 (quinze) dias - ou em outro prazo maior que o juiz fixar (inciso I, § 1º do art. 303) -, dando prosseguimento ao feito, na forma do art. 844 e seguintes da CLT. Não realizado o aditamento mencionado, o processo será extinto sem resolução do mérito.

Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito (§ 6o do art. 303 do NCPC).

Na sequência do NCPC, o art. 304 apresenta importante inflexão a ser debatida no âmbito das demandas sujeitas à Jurisdição laboral. É que, de todo modo, uma vez deferida a tutela de urgência antecedente, e havendo conformação da parte ré com essa iniciativa, a hipótese seria a de estabilização da demanda, na forma do art. 304 do NCPC. Veja-se, portanto, que somente na primeira hipótese do art. 303 (do pedido de tutela satisfativa antecedente) seria possível a estabilização da tutela provisória, na forma do art. 304 do NCPC.

O art. 304 do NCPC apresenta a hipótese em que a tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.

A questão ganha ares de dramaticidade na medida em que é sabido que o processo do trabalho não admite a recorribilidade imediata das decisões tidas como interlocutórias (art. 893, § 1º, CLT). Então, a partir de quando seria possível a estabilização da decisão dada em tutela provisória satisfativa de urgência antecedente no processo laboral?

O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 10ª Região, ao editar os enunciados sobre a aplicação do NCPC nos processos sujeitos à jurisdição daquele Regional, reputou por bem eleger como parâmetro o prazo decadencial do mandado de segurança - 120 (cento e vinte dias) -, considerando-o apto a ensejar a estabilização da demanda.

É que, consoante já cristalizou o Tribunal Superior do Trabalho (TST) acerca do assunto, como se depreende da Súmula nº 414, II, aplicável analogicamente, seria cabível o mandado de segurança para impugnar decisão judicial contra a qual inexistisse recurso específico (sucedâneo recursal). Nesses termos, o prazo da estabilização da tutela antecedente seria o mesmo prazo para o ajuizamento do Mandado de Segurança, segundo aqueles Enunciados:

Enunciado 14. MANDADO DE SEGURANÇA. CABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE DEFERE TUTELA ANTECIPADA. PRAZO DE ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE. No caso de deferimento de tutela antecipada requerida em caráter antecedente ou de tutela de evidência, por não ser cabível agravo de instrumento contra decisões concessivas de tutela provisória, na Justiça do Trabalho, deve ser impetrado mandado de segurança para impugná-las, operando-se a estabilização da tutela antecipada antecedente (CPC, art. 304) após o decurso do respectivo prazo de decadência de 120 dias.

Esse mesmo prazo fora apontado por Manoel Antonio Teixeira Filho (2015) para a hipótese da estabilização da tutela de urgência antecedente. Assim, uma vez proposta a demanda “simplificada”, acaso não haja a interposição de um meio de impugnação da decisão judicial, o processo será extinto (§ 1º do art. 304 do NCPC).

Aqui é importante pontuar que a estabilidade da decisão concessiva da tutela exige que i) a parte autora a requeira expressamente; ii) que o mesmo se manifeste expressamente no sentido de não ter intenção de dar prosseguimento ao processo, depois de obtida a tutela pretendida; iii) que seja concedida a tutela antecipatória; e iv) que seja inerte o réu diante da decisão antecipatória.

Em relação ao último item, importante pontuar que não se tornará estável a decisão antecipatória, ainda que havida a inércia do réu na apresentação da medida recursal contra a decisão, na hipótese de ter apresentado sua defesa. Como bem dizem Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria e Paula Sarno (2015, p. 608),

[...] se, no prazo de recurso, o réu não o interpõe, mas resolve antecipar o protocolo da sua defesa, fica afastada a sua inércia, o que impede a estabilização – afinal, se contesta a tutela antecipada e a própria tutela definitiva, o juiz terá que dar seguimento ao processo para aprofundar sua cognição e decidir se mantém a decisão antecipatória ou não.

De todo modo, ante a inércia do demandado no manejo do meio de impugnação da decisão, qualquer das partes poderá demandar a outra para rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada (§ 2º do art. 304 do NCPC) por meio de ação própria, mantendo-se seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º (§ 3º).

O juízo em que a tutela antecipada foi concedida torna-se prevento para a aludida ação do § 2º, facultado o desarquivamento dos autos a qualquer das partes.

Por outro lado, o direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2º, extingue-se após dois anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1º (na forma do § 5º).

Tal decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º do artigo (§ 6º). A decisão proferida em sede de tutela provisória de urgência antecedente faz coisa julgada meramente formal, mas não material, portanto, no prazo dos dois anos subsequentes à decisão em que houve a extinção do processo, em razão da concessão da liminar.

3.1.2.   Da tutela de urgência antecipada incidente

A previsão do art. 303 do NCPC não retira do autor ou de qualquer das partes a possibilidade de pretender a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, ainda que no curso da demanda, ou seja, incidentalmente (art. 300, NCPC).

Com efeito, a tutela de urgência poderá ser concedida quando houver os elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano, não se inviabilizando, por óbvio, a formulação de pedido, ao longo da demanda, pela parte que reputa ter preenchido os requisitos legais para tanto.

Tal expediente não guardará maiores formalidades, mormente porque, em se tratando de pedido possível em qualquer fase do processo ou grau de jurisdição, caberá ao juízo assim decidir, não sujeitando, em regra, tal decisão a recurso imediato, na forma do art. 893, § 1º, da CLT.

3.2.    Da tutela cautelar: das medidas cautelares típicas nas relações de trabalho

Além da tutela antecipada, seja antecedente ou incidentalmente, o NCPC consagrou ainda a possibilidade de o pedido de tutela de urgência cautelar ser formulado, naquelas hipóteses em que o provimento jurisdicional antecipado seja relevante para a própria instrumentalização do processo, no que também não inovou o legislador em relação ao regime cautelar havido anteriormente.

A inovação, por assim dizer, foi a eliminação da figura das denominadas demandas cautelares nominadas, como se identificava ao se lidar com as figuras do arresto (CPC-73, arts. 813-821), sequestro (CPC-73, arts. 822-825), busca e apreensão (CPC-73, arts. 839-843), exibição (CPC-73, arts. 844-845, 355-363 e 381-382), produção antecipada de provas (CPC-73, arts. 846-851), justificação (CPC-73, arts. 861-866), atentado (CPC-73, arts. 879-881), caução (CPC-73, arts. 826-838), entre outras.

A partir do NCPC, todas as aludidas medidas foram apresentadas como meras hipóteses do exercício da tutela de urgência de natureza cautelar, sem prejuízo de outras, diga-se, tal qual se deduz do art. 301 do NCPC:

Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.

Tal medida é relevante, portanto, apenas no sentido de permitir que se identifique que o que outrora era considerado medida processual autônoma, pretensão própria, doravante deverá ser compreendido apenas enquanto medida instrumental (pedido de tutela provisória) da tutela definitiva.

Tal compreensão, contrariamente ao quanto se pensa, não importa em medida exclusivamente conceitual, mas acaba por impor sensível impacto à própria autuação da pretensão cautelar perante os sistemas do Processo Judicial Eletrônico (PJE), a plataforma por meio da qual o Poder Judiciário Trabalhista tem exercido a sua função judicante.

Isso porque, tendo em vista o caráter meramente instrumental da medida cautelar, uma vez requerida em caráter antecedente, como se verá adiante, a pretensão principal deverá seguir nos mesmos autos da pretensão cautelar originária, dado que como tal não ganha, por assim dizer, vida própria, mas encontra-se vinculada definitivamente à pretensão principal.

Por isso mesmo o TRT da 10ª Região tomou o cuidado de explicitar, por meio do Enunciado nº 15, a aplicabilidade do NCPC ao processo do Trabalho, informando que a parte autora terá de formular, por mera petição, nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, a sua pretensão principal, respeitando a noção de acessoriedade da medida. É o que se depreende da redação do aludido enunciado:

Enunciado 15. PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO. TUTELA CAUTELAR REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE. PROPOSITURA DO PEDIDO PRINCIPAL NOS MESMOS AUTOS, POR SIMPLES PETIÇÃO. MUDANÇA DE CLASSE PROCESSUAL. Aplica-se ao Processo do Trabalho a regra do art. 308, caput, do CPC, segundo a qual, efetivada a tutela cautelar requerida em caráter antecedente, o pedido principal, sob pena de extinção da tutela cautelar, terá de ser formulado pelo autor, no prazo de 30 dias, por mera petição, nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar. A Secretaria, apresentado o pedido principal, procederá, para fins de apuração estatística, à retificação da autuação dos autos eletrônicos, inserindo a nova classe processual atinente à ação tida por principal.

Cumpre ainda mencionar que existem medidas cautelares específicas, no âmbito das demandas sujeitas ao Judiciário trabalhista, como defende Wagner Giglio (2007). Trata-se das medidas previstas no art. 659, IX e X, da CLT (transferência de empregado e estabilidade do dirigente sindical). Com efeito, prevê o primeiro dispositivo que é competência das Varas do Trabalho conceder medida liminar, até decisão final do processo, em reclamações trabalhistas que visem tornar sem efeito transferência disciplinada pelos parágrafos do art. 469 da Consolidação. Constitui medida acessória que visa resguardar a prerrogativa do empregado de comparecer ao juízo da localidade em que originalmente laborava, na hipótese de ser obrigado a contestar a remoção do seu local de trabalho a mando do seu empregador (art. 469 e seguintes da CLT). A previsão do inciso X, por sua vez, cuida da hipótese de reintegração liminar no emprego de dirigente sindical afastado, suspenso ou dispensado pelo empregador.

Feitas tais considerações, cumpre apontar que tais medidas cautelares também podem, por igual, serem formuladas de forma antecedente ou incidentalmente à demanda principal. É o que se verá.

3.2.1.   Da tutela cautelar antecedente

O art. 305 do NCPC faculta ao autor a formulação do pedido de tutela de urgência cautelar, em cuja petição inicial indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Caso a pretensão não seja propriamente cautelar, o próprio NCPC reputa possível que o juízo entenda que o pedido referido (de natureza antecipada) seja analisado sob o viés do disposto no seu art. 303; cabe então ao magistrado proceder ao enquadramento da pretensão, nos moldes previstos naquela hipótese legal.

Uma vez apresentada a pretensão cautelar antecedente, caberá ao juízo a apreciação ou não da liminar da medida requerida, sem ouvir a parte contrária, levando em conta inclusive o risco de torná-la imprestável.

Deferida ou não a liminar, deverá ser o réu citado para contestar (art. 306, NCPC) e indicar as provas que pretende produzir.

Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias (art. 307, NCPC). Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum.

No particular, alia-se a Manoel Antonio Teixeira Filho (2015), que entende não ser necessária a designação e a audiência para o recebimento da defesa do demandado, fato que contribuiria apenas para incrementar a sempre já abarrotada pauta das Varas do Trabalho, na hipótese dos pedidos meramente cautelares antecedentes. Assim, a defesa do demandado poderá ser apresentada diretamente na secretaria da Vara, sem a necessidade do comparecimento prévio à audiência para tanto.

Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que for deduzido (art. 308, NCPC). Uma vez apresentado o pedido principal, o feito prosseguirá regularmente, sob o rito ordinário (art. 306, § 3º).

A eficácia da tutela cautelar concedida em caráter antecedente permanece. Todavia, cessa a eficácia da aludida tutela concedida em caráter antecedente, se:

I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal;

II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias;

III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução de mérito.

Uma vez cessada a eficácia da tutela cautelar, deferida com base em uma causa de pedir específica, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento.

3.2.2.   Da tutela cautelar incidente

Como é óbvio, dada a abertura do próprio sistema que autoriza a adoção de qualquer medida adequada para asseguração do direito (art. 301, NCPC), o pedido cautelar poderá ser formulado a qualquer tempo, ao longo da demanda, desde que cumpridos os requisitos de lei para tanto, inclusive a necessária urgência da medida.

Não por outra razão, o § 1o do art. 308 do NCPC é claro ao indicar que o pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido de tutela cautelar, autorizando o manejo da pretensão cautelar inclusive na postulação inaugural, ou mesmo na apresentação da defesa do processo principal, pelo demandado.

O pedido de natureza cautelar é meramente acessório, e normalmente não implica a pretensão principal. Tanto assim que o art. 310 do NCPC prevê expressamente que o indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento desse, ressalvada a hipótese em que esse indeferimento seja o reconhecimento de decadência ou de prescrição, que uma vez ocorrendo em juízo, resta inviável a formulação do pedido principal.

3.3.    Da tutela da evidência

Por fim, cumpre tratar da denominada tutela da evidência. Referido instituto encontrava regulamentação no art. 273 do CPC-73, sob a denominação de “antecipação de tutela”.

A tutela de evidência, contrariamente à noção da tutela de urgência, vinculada à noção de perigo da demora, pressupõe a modulação dos ônus inerentes ao transcurso do tempo para o processo, em relação àquele que possui defesa eminentemente inconsistente.

Tal tutela provisória não está atrelada, portanto, à noção de adoção de qualquer medida no sentido de acautelar os interesses de quem quer que seja, tampouco de resguardar o próprio interesse processual.

De outro lado, também não está atrelada à noção de entrega definitiva da prestação jurisdicional, que continuará sendo provisória, sujeita à estabilização posterior, portanto.

O fato que parece relevante, no particular, é evidenciar que a denominada tutela de evidência encontra-se escorada na premissa de que aquele que possui defesa eminentemente inconsistente não deve impor ônus à outra parte, exclusivamente em razão da necessidade do cumprimento do iter processual, mas pode e deve ser beneficiado com a prestação jurisdicional, tão logo seja possível.

Ou seja, a tutela de evidência visa permitir àquele que se encontra em juízo, sujeito à demanda, que passe a fruir de determinados bens da vida, antes mesmo da conclusão de toda a sequência inerente ao processo, porque o seu ex-adverso não é capaz de apresentar elementos, seja de fato, seja de direito, capazes de, com seriedade, objetar-lhe a pretensão.

O art. 311 do NCPC reuniu algumas situações autorizadoras da concessão antecipada da tutela de mérito.

Dentre as hipóteses havidas no aludido dispositivo, a inconsistência da defesa, por parte de cada um dos litigantes, no âmbito das relações de trabalho poderá ficar demonstrada ou i) em razão do abuso do direito de defesa ou do manifesto propósito protelatório da parte, ii) quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, ou iii) quando a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. São as previsões contidas no art. 311 do NCPC.

A primeira hipótese, qual seja o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte, como bem leciona Daniel Mitidiero (apud WAMBIER, 2016), “[...] deve ser lido como uma regra aberta que permite a antecipação da tutela sem urgência em toda e qualquer situação em que a defesa do réu se mostre frágil diante da robustez dos argumentos do autor – e da prova por ele produzida – na petição inicial.”

Note-se, ainda, que não apenas o autor possui o direito à tutela da evidência, mas qualquer das partes, desde que caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório.

Tal expediente pode e deve ser utilizado no âmbito das relações de trabalho. Se é bem verdade que muitas das matérias sujeitas ao juízo laboral exigem alguma dilação probatória, e que por vezes não é possível a identificação do abuso do direito de defesa da parte, é certo que uma vez identificando tal situação, poderá a parte formular o pedido, e deverá o juízo deferi-lo.

A segunda hipótese, aquela em que as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, também autoriza a concessão da tutela provisória de evidência.

O que pretende o legislador, no particular, é facultar à parte o pedido da tutela antes da sentença quando, por meio de documentos, puder ser robustamente comprovada a alegação da parte.

A previsão legal exige, ainda, que tenha sido firmada tese em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, ou seja, que haja alguma estabilidade na compreensão jurídica sobre o tema sub judice. No particular, veja-se que a exigência do legislador conforma duas premissas: a de que i) exista alguma probabilidade de certeza quanto aos elementos fáticos que envolvam a questão (porque documentalmente comprovados) e ii) quanto à compreensão do direito a ser aplicado no caso concreto.

Veja-se que a provisoriedade da tutela, no particular, se justifica porquanto, embora exista alguma probabilidade de certeza quanto aos elementos fáticos que envolvam a questão, porque documentalmente comprovados, tais alegações encontram-se sujeitas à confirmação por meio de outras provas, por exemplo.

Ultrapassado o ponto acima, deve-se mencionar, todavia, que dentre as aludidas premissas não estão o cumprimento das súmulas (sejam do próprio TRT, do TST ou mesmo do STF), se não editadas sob a égide dos julgamentos dos casos repetitivos.

A omissão, no particular, pode ser lida enquanto um lapso do legislador, na medida em que sistemicamente não parece fazer sentido condicionar a concessão da tutela provisória de evidência apenas às hipóteses em que houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, quando o próprio art. 332 do NCPC, ao cuidar da hipótese da improcedência liminar do pedido, permite a extinção imediata da demanda com julgamento de mérito do pleito, portanto, em que, dispensada a fase instrutória (ou seja, em que exista alguma probabilidade de certeza quanto aos elementos fáticos que envolvam a questão), se esteja a julgar de acordo com o entendimento cristalizado pelo tribunal local, ou pelos tribunais superiores, ainda que não sujeito à égide dos julgamentos dos casos repetitivos.

Ora, se é possível encerrar definitivamente uma demanda proposta em razão do grau superior da improbabilidade fática e jurídica do pedido, não parece coerente se inviabilizar a concessão de tutela meramente provisória, sujeita à confirmação, portanto, quando evidenciada a probabilidade fática e jurídica do pedido.

Por fim, deve-se proceder à leitura da terceira hipótese referida, a atinente à petição inicial instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável (inciso IV do art. 311 do NCPC).

Embora tenha o legislador facultado ao autor o pedido de tutela da evidência, parece certo que nada objeta a que o réu também o faça, por meio de pedido contraposto ou mesmo de reconvenção. O inciso III do art. 311 não cuida de hipótese afeta às relações laborais (ação reipersecutória em contrato de depósito).

4.  Da tutela provisória no processo do trabalho: da iniciativa para a sua concessão

A ausência de disciplina expressa no âmbito da legislação laboral impõe a utilização subsidiária e supletiva das normas previstas no NCPC, como se depreende dos arts. 15 do Código e 769 da CLT. As tutelas provisórias, cautelares ou antecipadas, são mecanismos relevantes para a adequada prestação jurisdicional, plenamente adequadas à realidade dos conflitos submetidos ao Judiciário Trabalhista.

Se é certa a omissão da CLT no particular, com mais razão ainda é desejável um esforço no sentido de ser aplicado o CPC-2015 naquilo que permita a otimização da prestação jurisdicional no sentido de conferir a máxima efetividade ao valor trabalho, previsto no Texto Constitucional, devendo ser sopesada a pretensa incompatibilidade entre a previsão da CLT e o conteúdo do CPC-2015.

Trata-se de verdadeira colmatação teleológica em preenchimento das omissões da CLT, sempre que possível se materializar melhor ou maiormente a potencialidade para o valor constitucional da Justiça Social e do Trabalho, e em favor dessas mesmas relações. Não há dúvida de que as tutelas provisórias assim se inserem, portanto, de sua aplicabilidade no âmbito do Processo do Trabalho.

É o que se depreende exemplificativamente a partir da Súmula nº 405 do TST, que admite expressamente o cabimento do pedido de tutela provisória formulado na petição inicial de ação rescisória ou na fase recursal, visando suspender a execução da decisão rescindenda:

AÇÃO RESCISÓRIA. TUTELA PROVISÓRIA (nova redação em decorrência do CPC de 2015) – Res. 208/2016, DEJT divulgado em 22, 25 e 26.04.2016. Em face do que dispõem a MP 1.984-22/2000 e o art. 969 do CPC de 2015, é cabível o pedido de tutela provisória formulado na petição inicial de ação rescisória ou na fase recursal, visando a suspender a execução da decisão rescindenda. (BRASIL, 2016).

De outro lado, a fim de evitar dúvidas quanto à compatibilidade do regime da tutela provisória ao processo do trabalho, o TST pontuou o expresso cabimento da medida no processo laboral por meio da Instrução Normativa nº 39 (art. 3º, VI).

Há, todavia, questão relevante quanto à iniciativa da tutela provisória no âmbito das demandas sujeitas à jurisdição laboral. Afinal, o juízo poderia conceder tutela provisória de ofício?

Sabe-se que a execução no processo laboral pode ser iniciada de oficio (art. 856, CLT). Além, sabe-se que até então vigorava a previsão do art. 797 do CPC-73. Tais dispositivos permitiam a autorizadas vozes concluir que, fundada no poder geral de cautela do magistrado, lhes seria possível a concessão de tutelas provisórias (cautelares ou antecipatórias) sem mesmo pedido formulado pela parte.

O Poder Judiciário Trabalhista já teve a oportunidade de se pronunciar nesse sentido, reconhecendo a possibilidade da concessão da tutela antecipada de oficio:

MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA ANTECIPADA DE OFÍCIO. CABIMENTO NO PROCESSO DO TRABALHO. SEGURANÇA DENEGADA. De acordo com o art. 769 da CLT, as normas do processo civil somente serão aplicáveis ao processo do trabalho se forem compatíveis com os princípios deste. Nesse contexto, a exigência (art. 273, “caput”, CPC) do prévio requerimento da parte para a concessão da antecipação da tutela não pode ser importada de forma acrítica. Não seria coerente o Juiz do Trabalho pudesse o mais (execução de ofício), não podendo, contudo, poder o menos (antecipação da tutela de ofício). Tal interpretação, além de conflitar com os princípios do processo do trabalho, ignora a garantia constitucional ao acesso a um processo justo, célere e efetivo, especialmente na Justiça do Trabalho. Assim, constatando o Juiz do Trabalho que a reclamada está abusando do direito de litigar, não impugnando sequer documentos anexados à petição inicial, tornando os fatos verossímeis, pode, de ofício, antecipar os efeitos da tutela, determinando o imediato pagamento das verbas rescisórias, que têm natureza alimentar. (TRT-15 - MS: 02061-2009-000-15-00-6. 189 SP 000189/2010, Relator: SAMUEL HUGO LIMA, Data de Publicação: 30/07/2010)

Não parece possível, todavia, que a tutela provisória seja deferida de ofício. Com efeito, sendo a tutela satisfativa ou cautelar tutela de direito, em regra somente seria possível a sua concessão mediante pedido (arts. 2º e 141 do NCPC).

Todavia, dado que o processo se torna eminentemente colaborativo no processo civil, faculta-se ao juiz, percebendo que é possível a concessão da medida, consultar diretamente a parte a respeito do seu interesse em obter o provimento provisório. Se tal medida seria possível no âmbito das demandas ditas comuns, com muito mais razão poderia sê-lo no âmbito do processo laboral.

5.  Considerações finais

Não há dúvidas de que o tempo impõe efeitos relevantes ao processo, o que acaba por impactar na própria forma como a prestação jurisdicional é realizada. De outro lado, também não se ignora a necessidade de serem preservados não apenas o direito à pretensão (cautelar), mas mesmo o direito a fruir de determinados bens da vida, antes mesmo de todo o iter processual.

Por isso mesmo, elementar a aplicação das denominadas tutelas provisórias, regulamentadas no NCPC, às demandas sujeitas ao Judiciário Trabalhista, mormente porque assim reafirmam o desejo de uma prestação jurisdicional célere e mais efetiva.

Referências

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 405. Em face do que dispõem a MP 1.984-22/2000 e o art. 969 do CPC de 2015, é cabível o pedido de tutela provisória formulado na petição inicial de ação rescisória ou na fase recursal, visando a suspender a execução da decisão rescindenda. Res. 208/2016, DEJT divulgado em 22, 25 e 26.04.2016. Disponível em: <http://www3.tst.jus.br/ jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_401_450.html#SUM-405>. Acesso em: 20 abr. 2017.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/>. Acesso em 06 dez. 2017.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. Disponível em: <http://www.trt15.jus.br/voto/pdi2/2010/000/00018910.rtf>. Acesso em: 06 dez. 2017.

DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 10 ed. Salvador: Juspodivm, 2015.

MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Campinas: Bookseller, 1998.

PASSOS, José Joaquim Calmon. Ações Cautelares. In: DIDIER JR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno (Org.). Obras de JJ Calmon de Passos: ensaios e artigos. Salvador: JusPodivm, 2016. V II. p. 161-190.

TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Comentários ao Novo Código de Processo Civil sob a perspectiva do Processo do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2015.

Submetido em: 30 mar. 2017.

Aceito em: 13 abr. 2017.