O
PAPEL DO MAGISTRADO BRASILEIRO NO ÂMBITO PENAL
AGAPITO
MACHADO
Juiz
Federal da 4ª Vara, do Ceará
1.AS FUNÇÕES DO ESTADO. A
UNICIDADE DO PODER
1. A bem da
verdade, não são três (3) os poderes, mas sim as funções do Estado. O poder é
uno. As funções, harmônicas e independentes entre si (CF/88, art. 29), é que
são três (3), a saber: EXECUTIVA, LEGISLATIVA E JUDICIÁRIA.
2. As atribuições próprias e específicas de cada uma são: a) LEGISLATIVA
- criar o direito positivo, portanto, dar nascimento à norma jurídica; b) EXECUTIVA
- administrar e c) JUDICIÁRIA - aplicar a norma jurídico-constitucional aos
casos concretos.
3. O poder Judiciário, portanto, não age de ofício, necessitando de ser
provocado por aquele que se julga lesado, em seu direito por ato de terceiro,
ainda que esse terceiro seja o próprio Estado, em nome de quem é elaborada a
norma jurídica. A lei, como norma jurídica, é impessoal, geral e abstrata. O
Judiciário, então, através de seus órgãos, realiza o controle da
constitucionalidade. da norma jurídica, tanto no âmbito concentrado como no
difuso. Salvo em caso de Mandado de Injunção (art. 59, LXXI., da CF/88), o
Poder Judiciário só pode agir como legislador negativo, vale dizer, abstendo-se
de aplicar uma lei que padece de vícios de inconstitucionalidade. Não podemos
esquecer, todavia, que a lei traz em si a presunção "juris tantum" de
constitucionalidade. Se pudesse o judiciário sempre criar normas, estaria
havendo invasão na esfera do Poder Legislativo, o que é vedado pela
Constituição (art. 2º, da CF/88).
II. DA JURISDIÇÃO PENAL E
EXTRAPENAL
II.1. DA JURISDIÇÃO EXTRAPENAL
4. JurisdiÇão é
O poder que tem o Juiz de dizer o direito no caso concreto, em determinado
local e com força de definitividade (coisa julgada), quando acionado pelo
lesado.
5. Os estudiosos dividem a jurisdição em duas: a penal e a extrapenal.
Pelo critério da exclusão, tudo o que não for penal, será extrapenal, (civil,
constitucional, administrativo, processual civil, comercial,etc.)
6. Na chamada jurisdição extrapenal, é possível juridicamente que o Juiz
funcione como legislador positivo, vale dizer, criando a norma (lei) para o
caso concreto. Mas isto só lhe é possível na ausência da lei. É o processo
conhecido por integrarão do Direito, previsto no art. 4º, da LINC e art. 126,
do Código de Processo Civil, verbis.- "O Juiz não se exime de sentenciar
ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide
caber-lhe-á aplicar as normas legais, não as havendo, recorrerá à analogia aos
costumes e aos princípios gerais do direito".
7. A Constituição Federal de 1988 (art. 59, LXXI) trouxe outra novidade:
o Mandado de Injunção, cabível "sempre que a falta de normas
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade à soberania e à
cidadania". Quanto à jurisdição eleitoral o § 2º, do art. 5º., do ADCT da
CF/88 dispôs que "na ausência de norma legal específica, caberá ao
Tribunal Superior Eleitoral editar as normas necessárias à realização das
eleições de 1988, respeitada a legislação vigente."
II.2. DA JURISDIÇÃO PENAL
8. Mesmo para
os defensores do chamado direito ou justiça alternativa há consenso de que não
há respaldo legal para a criação, pelo Juiz, de norma penal (incriminadora), por
tanto, e!m matéria punitiva.
9. Como bem demonstra José Eduardo Faria, em seu livro JUSTIÇA, E
CONFLITO (Os Juízes em face dos novos movimentos sociais, RT), o Poder
Judiciário se sente impotente ante os novos conflitos sociais. Se o juiz
monocrático - de primeiro grau - despreza a norma existente para criar a que
melhor lhe aprouver no caso concreto, fazemos uma verdadeira justiça
alternativa, atende sem dúvida, aos anseios populares mas sua decisão não se
sustentará em grau de recurso. É que os Tribunais são muito conservadores. Se,
todavia, o Juiz monocrático aplica a lei existente, vinda do Legislativo, verá
sua decisão confirmada em grau de recurso, mas descumprida por, aquele a quem
se destina a ter, efetividade (o jurisdicionado).
Esse o dilema. Temos aí o exemplo típico no caso dos 147% Já Previdência
Social, o que acarreta conflito entre o Executivo, Legislativo e o Judiciário,
o que é lamentável em um estado de direito.
10. Se pudesse o
Juiz criar a norma que melhor lhe aprouvesse ante o reclamo social, a pena por
descumprimento à decisão judicial seria realmente apta a fazê-la respeitar. Não
haverá, como há, uma pena acanhada para o crime de desobediência (art. 330, do
C. Penal), que varia de 15 dias a 6 meses de detenção, delito esse afiançável e
facilmente prescritível retroativamente. Como se não bastasse, há quem entenda
que o descumprimento à decisão judicial não constitui crime de desobediência
(art. 330, do C.P.) nem de prevaricação (art. 319, do C.P.). É simplesmente uma
situação atípica (Milton Flakes). O descumprimento à decisão judicial, quando
muito, é um crime de responsabilidade, cuja Lei (4.898/65) não contempla todas
as autoridades que são obrigadas a cumpri-la. É o caso de se perguntar: a quem
interessa um Poder Judiciário forte? Por que não se cria um tipo penal próprio
dentro do Capítulo do Código Penal que trata dos crimes contra a administração
da justiça, com a pena mínima superior a dois (2) anos, tornando-o inafiançável
e difícil de acarretar a famigerada prescrição retroativa, como já sugeri ao
Ministro da Justiça e até ao Presidente do Supremo Tribunal, conforme trabalho
publicado na RT e na Revista da Associação dos Juizes Federais (AJUFE)?
11 . Portanto, no tocante à jurisdição penal não há possibilidade alguma
de aplicação do chamado processo de integração do direito por parte do Juiz.
Não há campo para aplicação da analogia, dos costumes e dos princípios gerais
do direito quando se trata da liberdade individual, face aos rígidos princípios
da legalidade e anterioridade da lei penal.
12. Pelos princípios da legalidade e anterioridade da lei penal, ninguém
pode ser punido ou ter exacerbada sua conduta se, antes do fato, não existir
lei dispondo sobre a punição da conduta proibida. A legalidade e a
anterioridade da lei penal são hoje princípios constitucionais (CF/88, art. 5º,
XXXIX). Somente uma nova Assembléia Nacional Constituinte poderá revogar tais
regras, que são fixas (art. 60, § 4º, IV, CF/88)
13. Em matéria punitiva (jurisdição penal), o juiz só poderá funcionar
como legislador negativo. Jamais positivamente, para criar um tipo penal ou
exacerbar a situação do réu, mesmo que ausente a lei. Só tem cabimento a
analogia "in bona partem".
14. Para os leigos e aqueles da área jurídica que não conhecem a
Constituição ou não querem aceitá-la e acham que o Juiz, em matéria penal, pode
fazer tudo, só porque é o desejo da sociedade, seria o caso de se indagar:
então, o Juiz pode aplicar a pena de morte a um cidadão porque o povo quer,
fora da hipótese do inciso XIX do art. 84 da CF/88? Numa causa trabalhista, por
exemplo, um Juiz pode acatar pedidos de reajuste de 1000% porque o povo quer?
Quanta ingenuidade de quem pensa assim. Tais pessoas ou não querem aceitar a
Constituição ou querem fazer média com o povo. O juiz é a lei e não a lei é o
juiz. Se o juiz não fosse a lei, teríamos a pior ditadura, que é a do
Judiciário. Não queiram experimentá-la, já que o Judiciário dá a palavra final.
Para que a lei fosse o Juiz era preciso que a Constituição tivesse eliminado as
funções do LEGISLATIVO, passando a existir apenas o EXECUTIVO e o JUDICIÁRIO.
(art. 29).
III. O DIREITO PENAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.
15. Aqueles que se dedicam ao estudo do Direito Penal sabem muito bem
que a Constituição Federal de 1988 trouxe inúmeras vantagens aos cidadãos,
acusados ou não, a saber:
a) “Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direitos e tem como fundamentos”:
III - a dignidade da pessoa humana";
b) "Art. 4º - A República Federativa do Brasil, rege-se nas suas relações
internacionais pelos seguintes princípios:
II - prevalência dos direitos humanos";
c) “Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes”:
I - . . .
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
IV - . . .
|V - É assegurado o direito de resposta proporcional agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente sua violação;
XI - A casa é asilo inviolável do individuo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou
para prestar.socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
XII - É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas,
de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem
judicial, nas hipóteses na forma que a lei estabelecer para fins de
investigação criminal ou instrução processual penal;
XXXV - A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito;
XXXVI - . . .
XXXVII - Não haverá juízo ou tribunal de exceção;
XXXVIII - É reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a
lei, assegurados;.
a) a plenitude da defesa; o sigilo das votações;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;
XIX - Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem
prévia cominação legal;
XL - lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar réu o réu;
XLI - A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades
fundamentais;
XLX, - Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de
reparar o dano e a decretação do perdimento dos bens ser, nos termos da lei,
estendida aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do
patrimônio transferido;
XLVI - A lei regulará a individualização da pena e entre outras as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
XLVII - Não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 841 XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento,
e) cruéis;
XLVIII - A pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a
natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX - É assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L - As presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com
seus filhos durante o período de amamentarão;
LI - Nenhum brasileiro será extraditado, salvo a naturalizado, em caso de crime
comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em
tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma dá lei;
LII - Não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de
opinião;
LIII - Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente;
LIV - Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal;
LV - Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes;
LVI - São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
LVII - Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença
penal condenatória;
LVIII - O civilmente identificado não será submetido a identificação criminal,
salvo nas hipóteses previstas em lei;
LXI - Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
LXII - A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados
imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele
indicada;
LXIII - O preso será informado de seus direitos, entro os quais o de permanecer
calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV - O preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou
por seu interrogatório policial;
LXV - A prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - Ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a
liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVII - Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo
inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do
depositário fiel;
LXVIII - Conceder-se-á "habeas corpus" sempre que alguém sofrer ou se
achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;
LXXIV - O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos;
LXXV - O Estado indenizará a condenado por erro judiciário, assim como o que
ficar preso além do tempo fixado na sentença".
16. O inquérito
policial, por ser uma peça sigilosa e inquisitorial, não havendo acusado mas
sim indiciado, tem sua importância apenas quanto à materialidade do delito, por
que traz o exame de corpo de delito. Quanto à autoria, não tem valor senão
quando, em juízo, o réu confirma sua confissão policial e tal se junta a outras
provas. Fora daí, a autoria, segundo o próprio STF (AC 1143, DJ 14-09-73, pág.
6738, Min. Aliomar Baleeiro, HC 43042 - Rel. Min. Pedro Chaves, e outros AC
40.727, Rei. Min. Lima Torres, in RTJ 540/44), é aferível somente perante o
Juiz, onde são assegurados ao réu ampla, defesa e o contraditório.
Todavia, para que o inquérito policial possa ter importância também quanto à
autoria é necessário que o Delegado que o preside cumpra criteriosamente,
dentre outros, o inciso LXIII, do art. 5º da CF/88, não só informando o preso
de seus genéricos direitos, entre os quais o de permanecer calado, mas
assegurando-lhe a assistência da família e principalmente de advogado.
Evidentemente que tal assistência não será a ponto de já ali, na fase policial,
ser exercida a ampla defesa, apesar, do inciso LV deixar transparecer isso aos
acusados em geral. A assistência de advogado inibe a possível intimidação que o
réu possa sofrer da autoridade policial. É que seria incrível o preso ter o
direito constitucional de calar e depor contra si mesmo.
A propósito do direito que tem o réu/preso de calar em seu depoimento, a
doutrina entende que tal direito pode ser exercido inclusive durante o
interrogatório judicial, estando, portanto, revogados os arts. 186 e 198, do
CPP, não prevalecendo mais o aspecto demoníaco da lei de que o silêncio do
acusado poderá ser interpretado em seu prejuízo. No momento em que a
acusado/preso/réu tem o direito de se calar, o seu interrogatório não mais se
constitui um meio de prova mas sim um meio de defesa. Dirá ele (interrogando)
apenas o que lhe interessar. Autores como Paulo Cláudio e João Batista Toto, in
"Primeiras linhas sobre o Processo Penal em face da Nova
Constituição", editora Sergio Antonio Fabris, 1989, pág. 22/23, afirmam
que: "Deste inciso, combinado com o de número LXIII ("o preso será
informado de seus direitos entre os quais o de permanecer sendo-lhe assegurada
a assistência da família e de advogado”), se extrai que, doravante, o indiciado
e o acusado não serão o ponto central da investigação da verdade, serão o
sustentáculo da prova. Delegados de Policia, promotores e Juizes criminais vão
ter que se esmerar na pesquisa da verdade mercê de outras provas, como as
perícias, testemunhais, indiciárias, documentais etc., o que, convenhamos,
significa notável progresso ante a postura anacrônica e um tanto medievalesca
de enfoque do imputado como a fonte de prova por excelência. Nenhum prejuízo
sofrerá a investigação da verdade com as mais expressas garantias. Ao
contrário, a atividade probatória tornar-se-á muito mais perfeita e, por isso
mesmo, muito mais eficaz no combate à delinqüência.
Os últimos resquícios da pesquisa ocasionalmente despótica cederão lugar à
busca inteligente da verdade. Outra será a imagem da polícia judiciária e da
própria justiça criminal. A investigação da verdade com o propósito de fazer
justiça será verdadeiramente científica. É o que se espera. De outro lado,
nenhuma dúvida pode mais restar à derrogação do art. 186 do CPP, advertência ao
réu de que o seu silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria
defesa. Espécie de cilada demoníaca da lei, e na qual caiam geralmente os
carentes. Outra norma draconiana que também jamais poderá ser invocada é a do
artigo 198 (o silêncio do acusado com de convicção do juiz), complementar na
primeira. Isto sem prejuízo do nosso ponto de vista reiteradamente sustentado
de que tais normas por atentatórias ao direito natural poderiam ter tido
vigência num Estado de direito.
Outras conseqüências do inciso LV em análise é a obrigatoriedade da presença do
defensor ao ato interrogatório. Posto que ... aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes não pode mais haver dúvida de que, a partir da ciência da
desencadeia-se a dialética probatória. Este, aliás, o ponto de vista enfocado
pelo eminente professor Alaor Terra na Semana de Estudos Jurídicos da PUC.
Continuamos sustentando, no entanto que se há de observar, não o contraditório
pleno, interrogatório do imputado, mas, sim, o contraditório restrito, em
obediência a um princípio ainda maior e também de direito natural, que é a
inviolabilidade do sacrário íntimo da consciência do imputado. Pois, de outra
modo haveria possibilidade de devassa nesse recinto impenetrável da alma
humana.
Somente o terceiro imparcial deverá interrogá-lo, observando-se o contraditório
restrito, pela presença fiscalizante da acusação e da defesa. Evidente que esta
questão se torna menos relevante na medida em que o acusado pode usar do
direito de calar sem sofrer nenhum prejuízo .
17. As provas obtidas por meios ilícitos sequer deverão ingressar no
processo (cfe. a CF/88, art. 5º, LVI). Todavia, face ao princípio
constitucional da presunção de inocência do cidadão (LVII), penso que o
Magistrado deverá deixar admitir os seus ingressos, para aferi-las apenas no
tocante à absolvição do acusado. Jamais uma prova obtida ilicitamente conduzirá
a uma condenação.
18. Se a prisão preventiva, quando já há início de um devido processo
legal (LIV, art. 5º, CF/88) é de difícil decretação pelo Juiz, conforme
entendem os Tribunais, é de duvidosa constitucionalidade a Lei nº 7.960/89, que
dispõe sobre a prisão temporária, em face dos incisos LIV, LV, LVII e LXVI, da
CF/88. Daí porque a OAB já propôs junto ao STF ação de inconstitucionalidade
questionando a referida lei.
19. Enquanto não for editada pelo Legislativo a lei a que se refere o
inciso LVIII, do art. 5º, CF/88, ninguém poderá ser identificado criminalmente.
Igualmente, enquanto não editada Lei pelo Legislativo, nenhum Juiz poderá
autorizar a chamada escuta telefônica (XII, do art. 5º, CF/88). É que, segundo
a doutrina e a jurisprudência, o art. 57, do Código de Telecomunicações- não
resolve o problema. Quem determina a escuta do aparelho telefônico dos
Presidentes da República, do Senado e da Câmara? Um Juiz singular? Quem
autorizaria a escuta telefônica de um Delegado da Polícia Federal? Um juiz
estadual? Por essas razões, é necessária a elaboração de Lei pelo legislativo
para, posteriormente, permitir a um juiz determinar o bloqueio de telefone para
fins de investigação criminal ou instrução penal.
20. A responsabilidade penal objetiva foi definitivamente eliminada do
nosso direito, na medida em que o inciso XLV, do art. 5º da CF/88, dispõe que a
lei regulará a individualização da pena enquanto que o inciso XLV diz que
nenhuma pena passará da pessoa do condenado e, principalmente em face da
"medida da culpabilidade" a que se refere o art. 29 do Código Penal,
após a Lei nº 7.208/84. Ressalva-se apenas a "actio libera in causa",
as contravenções e o preterdolo, segundo Magalhães Noronha.
21. Diante de tantos direitos conferidos constitucionalmente ao cidadão,
seja ele de bem ou não, o Magistrado é obrigado a ter redobrada cautela para
não condenar um inocente só à base de presunções ou desejo da imprensa e do
povo leigo. "É melhor absolver um culpado do que condenar um
inocente" (Roberto Lyra). "Condenar um possível delinqüente é
condenar um possível inocente" (Nélson Hungria). A condenação exige certeza
absoluta, não bastando sequer a alta probabilidade. A condenação de pessoas
inocentes, fato que já ocorreu no Brasil em várias oportunidades, tem levado o
Estado, por ato do Juiz que não cumpre a Lei e a CF/88 para atender aos anseios
populares, a indenizar o condenado, seja por ter havido erro judiciário, seja
porque o réu ficou preso além do tempo fixado na sentença. (LXXV, do. art. 5º,
CF/88). E por essa indenização quem paga é o povo, que contribui através dos
tributos e não propriamente o juiz.
22. Se a Constituição Federal é liberal, generosa, iníqüa e conduz à
impunidade dos poderosos, aqueles que a elaboraram (os Juizes não a elaboraram)
a revoguem, mas não se exija que o Juiz não lhe dê aplicabilidade. Afinal de
contas, foi com sua promulgação que o Brasil teve restabelecido o Estado de
Direito pelo qual muitos lutaram e morreram e, até hoje, as famílias procuram
pelo menos as ossadas de seus entes queridos.
23. Já se disse que o Poder Judiciário não age de ofício, mormente após a
CF/88. Destarte, para realizar um trabalho eficaz no combate à criminalidade é
necessário:
1º) Que existam leis realmente eficazes, oriundas do Poder Legislativo.
Conforme se demonstrará a seguir, é a lei brasileira a principal causadora da
impunidade no Brasil;
2º) Que a Constituição Federal seja realmente regulamentada, pelo menos naquilo
que propicie o combate efetivo a criminalidade. A escuta telefônica, por
exemplo, na situação descrita pelo art. 5º, XII, da CF/88, bem que já poderia
ter sido regulamentada para combater os crimes hediondos. Afinal de contas, já
estamos em 1994;
3º) O Inquérito Policial precisa ser bem elaborado, com observância já nessa
fase das regras constitucionais antes referidas, para então ter ele, quanto à
autoria, algum valor. A presença do MP já nessa fase é também indispensável
como fiscal da lei;, (CF, art. 129, II).
4º) A Denúncia não só deve ser bem elaborada, como acompanhada pelo MP, não
ficando o juiz sozinho à busca da verdade real. Afinal de contas, o MP é parte
tanto quanto o réu, incidindo a regra do art 5º caput, da CF/88.
24. Bem se vê
que, somente funcionando essas quatro (4) primeiras etapas, o judiciário terá
nas mãos instrumentos lealmente capazes de dirigir um processo para condenar os
verdadeiros culpados. Fora daí é querer apenas que o Judiciário seja a
palmatória do mundo, somente porque é o órgão que dá a última palavra sobre a
liberdade humana.
25. Tem sido
muito fácil as autoridades policiais realizarem os inquéritos da Constituição e
dizerem os inquéritos sem observância da Constituição e dizerem que tudo está
entregue à Justiça e que a Polícia prende e a Justiça solta. Isso é
simplesmente querer expor o Poder Judiciário, que não deve ser responsabilizado
pelos atos anteriores (existência de leis ineficazes, falta de regulamentação da
Constituição, inquérito policial mal elaborado e denúncia não acompanhada pelo
Ministério Público). Quem solta o preso é a LEI. O Juiz é apenas o instrumento
para fazer cumprir a lei, como guardião maior dos direitos e garantias
individuais. Se a lei é anacrônica e iníqua, que então o legislador a revogue.
26. Ao -contrário da jurisdição extrapenal, o juiz, na penal, procura a
verdade real, vale dizer, não fica à espera apenas do que possam produzir as
partes. Mas é preciso entender que o juiz não pode se substituir ao Ministério
Público que se mostrar inerte, porque então estaria tratando desigualmente o
réu que é a outra parte, o que é vedado pelo art. 5º, caput, da CF/88. O MP é
parte tanto quanto o réu. O juiz não pode ouvir testemunhas referidas apenas
pelo cognome, sem endereço correto e atualizado, mormente quanto o réu responde
ao processo preso, sob pena de dilatar a instrução criminal e propiciar a
impetração de habeas corpus por excesso de prazo.
27. A impunidade, no Brasil, está muito ligada à ineficácia das Leis
brasileiras. Vejamos apenas alguns casos:
a) A Lei Fleury, elabora muito antes da CF/88, diz que o réu
absolvido será logo posto em liberdade. É verdade que essa lei hoje está
compatibilizada com a presunção de inocência do cidadão (art. 5º, LVII, da
CF/88). Diz-se que, na época, referida lei surgiu apenas para beneficiar o
antigo Delegado Fleury e, portanto, teria sido uma lei dirigida, o que terminou
beneficiando vários bandidos;
b) O crime de estelionato (art. 171, do C.P.), o que mais tem causado prejuízo
ao povo, tem a pena mínima fixada em 1 (um) ano de reclusão. Isso implica dizer
que se o réu for primário e de bons antecedentes e inexistindo outro óbice art.
59 c/c 68 do CP), normalmente, segundo o STF, será apenado, se condenado, nessa
pena mínima de 1 (um) ano, o que equivale a dizer, não foi nem vai para a
cadeia, seja porque o crime é afiançável, seja porque será beneficiário do
SURSIS. Portanto, a regra no Brasil é que 90% dos crimes são AFIANÇÁVEIS porque
com pena mínima abstrata menor de 2 (dois) anos. E mesmo que haja condenação,
CABERÁ ) SURSIS e a prescrição retroativa, que só existe no Brasil, termina
inclusive por afastar o próprio direito punitivo (de ação) do Estado, em
benefício dos delinqüentes;
c) A Lei 8.072/90, por incrível que pareça, veio melhorar Duplamente a situação
dos traficantes de drogas. Primeiro, permitiu-lhes recorrer em liberdade, caso
tenham respondido a processo solto e venham a ser condenados. Segundo, revogou
o art. 14, da Lei 6.368/76. Hoje, a quadrilha, só será Considerada criminosa se
tiver, no mínimo, quatro pessoas (antes, eram apenas duas) e a pena, que era de
3 a 10 anos de reclusão, ficou de 3 a 6 anos. Os aventureiros que dizem
combater o tráfico de tóxico às custas de votos fáceis, não explicam com
coerência por que aprovaram a revogação do art. 14, da Lei Antitóxico (Lei
6.368/76), que era muito mais rigorosa para os quadrilheiros;
d) Com raríssimas exceções, o condenado por crime previsto no C. Penal só
cumprirá pena em regime fechado se apenado com mais de 08 (oito) anos de
cadeia, o que, convenhamos, é bastante difícil.
JUIZ, UM SACERDÓCIO
Na revista AJUFE, nº 30, um artigo do Ministro Sidney Sanches,
Presidente do STF, sobre o tema O JUIZ E OS VALORES DOMINANTES (o desempenho da
função jurisdicional em face dos anseios por justiça) lembra, verbis:
JUIZ E OS VALORES DOMINANTES, já suscita algumas questões.
Que são valores dominantes? A moral? A ética? A verdade? O
trabalho? A busca do conhecimento da perfeição? Sem dúvida todos são valores
sempre dominantes. Viver honestamente, não lesar a outrem e dar a cada um o que
é seu, são lemas do direito da justiça . E tem muito a ver com a moral, com a
ética com a verdade.
O trabalho e a busca do saber e do aperfeiçoamento são o instrumento e o meio,
pelos quais se pode chegar à prática desses valores. O Direito positivo e moral
nem sempre caminham juntos. Às vezes se afastam muito. O direito, porém, não
deve ser interpretado imoralmente. A interpretá-lo, deve o juiz entender a moral
da época em que elaborado e aqui em que deverá aplicá-lo, à busca de solução
que mostre compatível com as novas circunstâncias, sem refugir à inspiração da
norma que interpreta. Bom caminho para o juiz é o do culto profundo do direito
o aprimoramento do senso de imparcialidade, de responsabilidade e de justiça, a
preocupação com direitos e faculdades, deveres e obrigações das partes em
conflito e com a solução adequada das lides.
Tudo sem menosprezo ao interesse público e à necessidade de paz social. Num país
de enormes conflitos sociais, políticos, jurídicos, econômicos e morais como é
o Brasil, ganha enorme relevo o poder daquele a quem se confere, em nome da
Nação, a missão de dirimi-los. Cresce, em proporção geométrica, sua
responsabilidade, para evitar que, mediante decisões
temerárias, arbitrárias e injustas, ao invés de dirimi-los, amplie ou perpetue.
O juiz deve ser estudioso dos autos e do direito, trabalhador infatigável,
corajoso, independente, enérgico, equilibrado. O juiz tem um poder tão grande,
dentro dos limites constitucionais e legais, que deve cuidar sempre e sempre de
não incidir em abuso .
A independência do juiz mede-se pelo perfeito ajustamento entre as soluções que
encontra, as decisões que profere, e só ditames de sua consciência jurídica. A
consciência jurídica de cada Juiz depende de sua formação técnica e filosófica,
no sentido mais amplo, abrangendo-lhe a cultura jurídica, a visão política,
econômica, social, moral e até, eventualmente religiosa (se professar
religião).
E como essa formação se dá com enorme diversidade entre as pessoas, oriundas
das mais distintas classes econômicas e sociais, é inevitável que, mesmo juizes
independentes, isto é, que só decidem de acordo com sua consciência jurídica,
cheguem, apesar disso, a conclusões parcial ou totalmente divergentes.
Isso também explica porque juizes da mesma comarca, do mesmo Estado, da mesma
região, encontram soluções nem sempre convergentes para as mesmas questões:
Isso igualmente explica as discrepâncias nos órgãos colegiados de jurisdição
ordinária ou extraordinária. Mas a constatação leva também à necessidade de
cultuar o respeito pelo entendimento alheio, sempre que ditado pela consciência
jurídica.
Não deve o juiz ceder à tentação de proferir decisões simpáticas, só por serem
simpáticas, se não forem justas. Não deve ceder à tentação de ganhar
notoriedade, à custa de decisões temerárias, arbitrárias e injustas. Ou apenas
para suscitar polêmica e obter destaque pessoal. Mas também não deve se
intimidar diante da possibilidade de decisões que, tomadas de acordo com sua
consciência jurídica, possam repercutir negativamente na chamada "opinião
pública". Até porque nem sempre ela se forma, pelo caminho da verdade,
mas, freqüentemente, da versão, mediante deturpação de fatos, desinformação e,
manipulação maliciosa e interesseira de dados reais. E até de informes irreais.
A isenção do juiz, em face das partes e dos interesses em jogo, quando voltada
para o estudo cuidadoso dos autos e, do direito, é indispensável ao encontro de
soluções corretas. E a tudo se soma o senso do justo. Quando a lei não favorece
uma interpretação justa para o caso concreto, busque o juiz interpretá-la com
justiça. Não lhe é dado, porém, recusar-lhe aplicação, como revogador de lei ou
como legislador.
A 2ª parte da exposição concerne ao DESEMPENHO DA FUNÇÃO JURISDICIONAL EM FACE
DOS ANSEIOS SOCIAIS POR JUSTIÇA. Aqui não devemos ficar apenas no enfoque do
posicionamento técnico e filosófico do juiz. É preciso descer também ao exame
de sua conduta funcional e pessoal. Essa colocação põe em evidência a
necessidade do exame dos deveres dos magistrados. Como sabem os senhores, o
Supremo Tribunal Federal está concluindo o exame de um esboço de anteprojeto do
Estatuto da Magistratura Nacional, a ser enviado brevemente ao Congresso
Nacional.
Nele, até aqui, foram arrolados como deveres dos magistrados
I - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular; II - zelar pelo
prestígio da Justiça e pela dignidade de sua função; III - praticar os atos de
ofício, cumprir e fazer cumprir as disposições legais, com independência,
serenidade e exatidão; IV - comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o
expediente, audiência ou sessão, e não se ausentar injustificadamente antes do
seu término; V - não exceder, sem justo motivo, os prazos para decidir ou
despachar; VI - determinar as providências necessárias para que os atos
processuais se realizem nos prazos :legais VII - não manifestar opinião, por
qualquer meio de comunicação, sobre processo pendente de julgamento, seu ou de
outrem, ou juízo depreciativo sobre despacho, votos ou decisões de órgãos
judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício
do magistério; VIII - exercer permanente fiscalização sobre os servidores subordinados,
especialmente no que se refere a cobrança de custas, emolumentos e despesas
processuais, mesmo que não haja reclamação dos interessados; IX - tratar com
urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as
testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça e atender aos que o
procurarem, a qualquer momento, quando se trate de providência, que reclame e
possibilite solução de urgência; X - residir na sede de sua jurisdição.
Aos desavisados e principalmente aos não vocacionados, pode parecer que se
pretende impor um regime colegial ou até militar.
Na verdade, o que se pretende é a formação de juízes (homens e mulheres), em
cujo exemplo a sociedade, a quem servem, deve se mirar. E do qual pode se
orgulhar.
Precisa o juiz manter conduta irrepreensível na vida pública e particular, para
que possa ter condições de julgar as partes e seus conflitos, sem
constrangimento pessoais, com limpos e avaliações seguras. Deve o juiz zelar
pelo prestígio da Justiça e dignidade de sua função, não para ostentar força
posição social, mas para mostrar que a Justiça é instituição séria e que merece
respeito e confiança.
Deve o juiz praticar os atos de ofício, cumprir e fazer cumprir as disposições
legais, com independência, serenidade e exatidão, porque só assim terá
autoridade para exigir que todos o façam.
Deve comparecer pontualmente a hora de iniciar-se o expediente, audiência ou
sessão, e não se ausentar injustificadamente de seu término, não para parece um
burocrata disciplinando, mas, sim, uma autoridade que cumpre seus deveres e por
isso exerce seus poderes. Para que os seus subordinados não se valham de seu
mau exemplo e se animem a insubordinações que tenham, por isso mesmo, de ser
toleradas.
Sem justo motivo não deve exceder os prazos para decidir ou despachar. Como se
sabe, nem, sempre é possível cumprir os prazos, diante do volume de processos e
de responsabilidades concomitantes. Ma sempre se há de poder demonstrar a
existência de justo motivo para eventual retardo.
Para que, os atos processuais se realizem nos prazo deve o juiz determinar
providências necessárias. Sobretudo preventivas. E quando justificáveis, também
repressivas.
O juiz não opina. Decide. E só decide causas que lhe estejam afetas, na
oportunidade própria e nos autos. Não antecipa seus pontos de vista nem faz
pré-julgamentos. Não se manifesta sobre processo pendente de julgamento, seu ou
de outrem. Não emite juízo depreciativo sobre votos ou decisões de órgãos
judiciais. Apenas se lhe ressalva a possibilidade de crítica nos autos e em
obras técnicas ou no exercício do magistério.
Tudo isso se justifica: a instituição, para ser respeitada, precisa estar
composta por pessoas que se respeitam. E o direito à crítica, apesar disso,
subsiste nos limites e circunstâncias já referidos.
Exercer permanentemente fiscalização sobre os servidores subordinados,
especialmente no que se refere à cobrança de custas, emolumentos e despesas
processuais, mesmo que não haja reclamação dos interessados.
Isso para que, com sua missão ou negligência não acabe o juiz contribuindo para
os abusos e para a corrupção.
Tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os
advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, enfim,
todas as pessoas que o procurem, é dever funcional do juiz, ditado pelas regras
de educação e de convivência humana.
Atender aos que o procurem, a qualquer momento, quando se trate de providência,
que reclame e possibilite solução de urgência, nos limites de sua competência,
é dever que, ao invés de aviltar, enobrece a função do juiz e que alcança
enorme repercussão na verdadeira opinião pública. Naturalmente também saberá
avaliar quando está sendo molestado ou procurado desnecessária ou abusivamente.
Residir na sede de sua jurisdição é dever que se justifica, pela necessidade
permanente do magistrado no local do exercício da função.
Quando não for possível a residência por razões justificáveis e
compreensíveis, devem ser submetidas ao órgão judiciário competente.
O esboço ainda estabelece, para o juiz, o dever de remeter, até o dia dez de
cada mês, ao órgão corregedor competente, informação sobre os feitos
distribuídos, julgados ou em andamento no mês anterior. E veda ao magistrado:
I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de
magistério:
II - receber, a qualquer titulo ou pretexto, custas ou participação em
processo;
III - exercer atividade político-partidária;
IV - exercer o comércio ou participar de sociedade comercial,
inclusive de economia mista, exceto corno acionista ou cotista;
V - exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou
fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe de
magistrados e sem remuneração.
Não se incluem, entre as vedações referidas em alguns desses ítens, as
atividades exercidas em curso ou escola de formação e aperfeiçoamento de
magistrados, criados ou reconhecidos pelo Poder Judiciário.
Permite-se ao magistrado o exercício de um cargo ou função de magistério,
porque isso propicia a atualização e aperfeiçoamento de seus conhecimentos, no
interesse de bom exercício da missão de julgar. E não mais que um cargo, para
que não se exceda em aulas e descure dos deveres de juiz.
Repugna à Constituição tolerar que o juiz, a qualquer título ou pretexto,
receba custas ou participação em processo.
A tolerância, como é óbvio, poderia incentivá-lo a interesses menos nobres, com
a procriação de feitos, seu retardamento e encarecimento.
A militância na política partidária retiraria do juiz a indispensável
imparcialidade e impregnaria seus atos de suspeição. Sobretudo durante
processos eleitorais. Praticar o comércio ou participar de sociedade comercial
é ato que se não deve permitir ao juiz, para que não desvie suas atenções e não
passe a competir com setores cujos interesses ele próprio tem de julgar com
isenção.
Tolera-se, porém, que figure como acionista ou cotista de sociedade de economia
mista, ficando, porém, impedido de atuar em causas de seu interesse.
A proibição de exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil,
associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, também busca evitar
que o magistrado diversifique demais seu campo de atuação, descuidando do que
lhe é próprio.
Permite-se, porém, a direção de associação de classe, porque não é atividade
desprimorosa e, bem exercida, pode trazer proveito à instituição, que não se
inspira em interesses pessoais e fisiológicos, mas no idealismo dos homens de
bem. Não pode, porém, tal atividade ser remunerada, pois, então, a nobreza da
atuação poderia ser ao menos questionada.
E as vedações, contidas em alguns desses pontos, não se aplicam às hipóteses em
que as atividades do juiz são exercidas em curso ou escola de formação e
aperfeiçoamento de magistrados, criados ou reconhecidos pelo Poder Judiciário,
porque tal atividade, quando criteriosamente exercida, favorece sua cultura e a
própria instituição.
Como é sabido, o futuro Estatuto da Magistratura Nacional apenas fixará normas
relativas à organização e funcionamento do Poder Judiciário e ao regime
jurídico da magistratura nacional, observados os princípios da Constituição
Federal.
Mas as leis de organização judiciária, desde que respeitem a Constituição e o
Estatuto Nacional, poderão impor outros deveres aos magistrados, segundo as
peculiaridades locais, sem lhes afetar as garantias, prerrogativas e direitos,
como é óbvio.
O esboço, como cuidou de deveres de magistrados, precisou cuidar também de sua
responsabilidade disciplinar, sem prejuízo da responsabilidade civil e
criminal.
E naturalmente teve de regular também as penas disciplinares.
Estabeleceu que a atividade censória dos Tribunais e seus órgãos disciplinares
será exercida com o resguardo devido à dignidade e à independência do
magistrado, a este sempre assegurada ampla defesa. Esclareceu ainda: salvo os
casos de grave incontinência de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou
prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que
proferir.
Quanto a esse ponto, devo destacar que o juiz, mesmo quando provocado por
incontinência de linguagem de uma das partes ou de seus representantes, deve
manter a linguagem adequada à seriedade do processo e da justiça, ainda que
intimamente se sinta tentado a expressões de desabafo e de revolta. Sem
prejuízo, é claro, de eventual exercício do direito de provocar a instauração
de processo, por crime de injúria, calúnia e difamação, quando for o caso.
Teve o esboço de cuidar, também, das penas disciplinares, quais sejam a de
advertência, censura, disponibilidade e demissão.
As penas de advertências e censura aplicáveis a qualquer magistrado, a de
disponibilidade exclusivamente a juiz vitalício e a de demissão apenas o juiz
não vitalício.
As penas de advertência, censura e demissão somente imponíveis pelo voto da
maioria absoluta de respectivo Tribunal e a de disponibilidade, por voto de
dois terços, assegurado, em qualquer caso, ampla defesa. A de advertência
aplicável reservadamente, por escrito, em caso de negligência no cumprimento
dos deveres do cargo.
Prevê-se ainda que na hipótese de disponibilidade punitiva, o Tribunal, a
requerimento do interessado, passados cinco anos do termo inicial, examinará a
ocorrência, ou não, de cessação do motivo de. interesse público, que a
determinou.
A pena de censura é de se aplicar, reservadamente, por escrito, em caso de
reiterado descumprimento dos deveres do magistrado, se a infração não
justificar pena mais grave.
Estatui-se, ainda, que o juiz punido com censura não poderá figurar em lista de
promoção por merecimento pelo prazo de um ano, contado da imposição da pena. A
pena de demissão, a juiz não vitalício, é prevista para as seguintes hipóteses:
I - negligência contumaz no cumprimento dos deveres do cargo;
II - procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas
funções;
III - escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou procedimento funcional
incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário;
IV - prática de atos vedados pelo estatuto. Já o magistrado vitalício, segundo
o esboço, só perderá o cargo, em virtude de sentença judicial transitada em
julgado:
I - em ação penal por crime comum ou de responsabilidade;
II - em ação cível para a perda do cargo, nas hipóteses de exercício de
atividades vedadas pelo esboço de anteprojeto de estatuto.
Estuda-se, ainda, no Supremo Tribunal Federal a questão relativa à legitimação
ativa para a ação cível de perda do cargo de juiz vitalício e sobre órgão
judiciário competente para seu processo e julgamento. Todas essas
considerações, a respeito de regime disciplinar, estão sendo feitas, por mim,
obviamente com certo desconforto.
Mas é que o tema proposto, ligado a deveres do juiz, em sua conduta pública e
privada, exige que elas sejam enfrentadas.
Na verdade, porém, o que mais importa é que o juiz possa ter tido como exemplo
de bom comportamento, em sua vida funcional, social e familiar.
E para isso muito influirão os valores dominantes de sua formação.
É de se lembrar, ainda, que qualquer que seja a conduta pessoal e funcional do
juiz, ela se refletirá em imagem positiva ou negativa da Justiça, do Poder
Judiciário, para o cidadão que o observa, para a sociedade em que vive".
Na Editora Jurid Vellenich Ltda. publiquei "A Sentença Penal e o Código
Penal Brasileiro de 1984", mencionando
III - ASPECTOS A SEREM CONSIDERADOS NA SENTENÇA
Sendo a sentença ato do juiz, é necessário se traçar o seu verdadeiro perfil.
Embora para alguns sejam difíceis, considero como fáceis os seguintes aspectos:
a) o juiz deve dar o direito a quem efetivamente tem, motivo pelo qual não deve
atender a pedidos, extra-autos, nem de George Bush nem de Sadam Hussein, Pedido
de político, nem pensar. Quando a política entra pela porta a justiça deve sair
rapidamente pela janela. É que pedidos extra-autos sempre encerram uma grande
injustiça. Pedir para o juiz decidir, contra o Direito, em favor de uma parte,
é vislumbrar prejuízo para a outra. Várias foram as pesquisas realizadas e,
embora não se reconheça o seu caráter científico, ficou afirmado que, no
Brasil, o povo não acredita no Judiciário. E até faz grande confusão entre
Justiça e Ministério da Justiça. Temos que reverter esse quadro. Lembremo-nos
daquele moleiro que acreditou na Justiça Alemã e não se intimidou com o Rei que
queria se apropriar de suas terras. A justiça é coisa séria não existe para
proteger artigos ou prejudicar inimigos. O juiz, na sua função jurisdicional,
não deve ter amigos nem inimigos, até porque está, em tais casos, obrigado a declarar-se
suspeito. Poucos são os que compreendem porque só para o ingresso na
magistratura de 1º grau, se exige aprovação em concurso de provas e títulos;
b) o juiz não julga a lei, julga com a lei, aplica-a, mesmo dela discordando,
salvo se contrária a Constituição;
c) o juiz não deve ser risonho nem sisudo, e muito menos decidir fazendo média
com as partes e a sociedade. O juiz de 1º grau não está adstrito nem mesmo à
opinião do STF. O juiz que não tem decisões reformadas pela instância superior,
não tem opinião própria e, de repente, pode ser um grande subserviente, de quem
não precisam os jurisdicionados. Eliezer Rosa, in "A Voz da Toga",
Barrister's Editora Ltda., RJ, pag. 49, nos dá a seguinte lição,
"verbis": "E aqui vai um conselho da experiência: não tenha o
juiz a lei de cor. Se à força de manejar o Código chegar a decorar seus textos,
busque esquecer. Sempre que tiver de aplicar uma lei, abra o Código e leia o
texto que entende aplicável. Leia-o, em momentos diversos, em horas diferentes.
Dessa leitura pode surgir inesperadamente uma nova interpretação benéfica.
Durante mais de , meio século os tribunais franceses leram o art. 1382 do
Código de Napoleão e o aplicavam tal como lhes soava sua letra. Um grave
acidente que vitimou um grande número de operários, que ficariam ao desamparo
de uma necessária indenização, segundo a doutrina tirada do dito texto, Levou
um juiz estudioso a uma leitura do revelho artigo. E sem mudar uma só palavra
no anoso texto, levou ao seu tribunal uma leitura nova, uma inteligência nova
daquele versículo legal. Nesse dia, nasceu para o mundo ocidental a teoria da
responsabilidade sem culpa;
c) Hugo de Brito Machado, Juiz do TRF da 5ª Região, em trabalho a ser
publicado, assevera que entre as qualidades do bom juiz estão a honradez,
dedicação ao trabalho, inteligência, independência, equilíbrio e a coragem.
Permito-me acrescentar mais um: a atualização. É que, no Brasil, país de muitas
leis, ineficazes, o Presidente da Republica, todos os dias, expede Medidas
Provisórias até porque o Poder Legislativo se omite na iniciativa das leis.
Lembra Hugo Machado que um Ministro do extinto TFR já dizia "nada causa
maior repulsa do que um juiz fraco, bajulador, covarde, medroso e rastejante.
Firmeza, altivez, coragem e independência são qualidades para que um juiz possa
ser justo. O juiz só deve ajoelhar-se diante de Deus".
O mesmo Juiz Hugo de Brito Machado, hoje Presidente do eg. TRF da 5ª Região,
publicou na Revista AJUFE nº 31, . verbis":
JULGANDO O JUIZ
A parte vencida em qualquer demanda jamais admite esteja correto o julgado.
O juiz que lhe denegou a pretensão estava desinformado, não examinou a prova
com o necessário cuidado, ou não conhece a lei, ou então estava comprometido,
seja pelo receio de desagradar alguém, seja pelas ligações que tem com a parte
contrária, ou seu advogado, ou por motivos moralmente ainda mais reprováveis.
Na melhor das hipóteses, a parte vencida argumentará com o velho conflito entre
o legal e o justo. Dirá que o julgado até pode estar de acordo com a
interpretação literal da lei, mas é extremamente injusto, e o juiz tem o dever
de fazer justiça, havendo de colocá-lo acima de qualquer outro. Ou então, em
sentido oposto, dirá que o juiz valeu-se de argumentos subjetivos, a pretexto
de fazer justiça, quando o seu dever essencial é o de aplicar a Lei.
Quando a parte vencida é capaz de adotar comportamento moralmente reprovável
tenderá ela a imputar ao juiz tal comportamento.
Seja como for, a juiz não escapa à condenação, quando é julgado por quem teve
alguma pretensão indeferida e tal julgamento é na verdade facilmente
explicável: a parte é diretamente interpretada na causa e por isto sempre
entende que a razão está do seu lado . Quem perde a questão, portanto, jamais
aceita que o julgamento estava correto.
Ninguém pode ser juiz da causa em que é parte. Pela mesma razão, o julgamento
que a parte faz do juiz que julgou sua causa é sempre desvalioso, porque eivado
de evidente suspeição .
Disto não se pode deslembrar quem ouve alguém acusar um juiz de parcialidade.
Deve o ouvinte, neste caso procurar saber se o acusador teve algum interesse
desatendido pelo juiz a quem está acusando. E mais ainda, deva avaliar a
acusação tendo em vista a credibilidade do acusador.
A posição do juiz por tudo isso, é sempre muito delicada, pois em todo o
processo há de haver alguém vencido, alguém com interesses contrariados.
Mais difícil ainda é a posição do juiz quando aprecia questão de quem sabe já
haver dado demonstrações concretas de sua capacidade difamatória e de sua
predisposição para fazer acusações contra ele. O juiz, temerosa de sofrer
agressões morais, pode: a) afirmar suspeição por motivo de foro íntimo ou
encontrar, outra forma de afastar-se do caso, ou ainda, b) julgar a causa a
favor da parte que se revele com maior potencial agressivo.
Se a primeira dessas alternativas não pode ser inteiramente descabida a segunda
consubstancia conduta indigna, reveladora de fraqueza incompatível com a
judicatura, desprezível sob todos os aspectos. A rigor, porém, o verdadeiro
juiz não adota aquelas atitudes, não se demite de sua função, nem a exerce em
detrimento de sua verdade jurídica, ainda que isso lhe custe toda a sorte de
constrangimento.
Admitir o contrário seria esquecer o princípio do juiz natural, vale dizer, do
juiz preestabelecido pelo ordenamento jurídico. Segundo esse princípio, o juiz
não deve ser escolhido por critérios subjetivos para julgar determinado caso. A
definição da competência jurisdicional há de ser decorrente de critérios
objetivos fixados antes do surgimento do conflito a ser apreciado e resolvido.
A parte, por razões óbvias, não pode escolher o juiz que vai apreciar as
questões de seu interesse. Assim, não se pode demitir da causa o juiz em face
de ameaças da parte, pois estaria dando a esta o poder de, excluindo-o,
escolher o juiz de sua conveniência.
Finalmente, não se deve o juiz magoar com as ofensas a ele e irrogadas pela
parte cujo interesse tenha contrariado. Ela muitas vezes acredita,
sinceramente, que tem razão. Julgando o juiz, a parte vencida tende sempre a
condená-lo, porque, afinal, como parte que é, com interesses contrariados, não
pode ter a isenção exigível de quem julga.
Menos magoado deve ficar o juiz quando as ofensas partem de quem já deu sinal
de ser portador de paranóia querelante. "O litigante paranóico geralmente
perdeu um processo, ou não lhe deram a devida razão ou pelo menos na forma em
que esperava. Recorre sempre, torna a perder, vai a todas as instâncias, mas
não se conforma nunca e busca sempre novos caminhos. A princípio apela para
questões de Direito Ordinário, mas logo transcende a motivos de ordem moral ,e
filosófica, desenvolve intensa atividade, acumula provas, vai aos a-pedidos dos
jornais, onde deixa transparecer idéias de grandeza, de misticismo e de
civismo" (J Alves Garcia, Psicologia Forense, 2ª Edição, Irmãos Pongetti -
Editores, Rio de Janeiro, 1958, pag. 330).
A respeito dos portadores de paranóia querelante, escreve Altavila: "Estes
enfermos ostentam, muitas vezes, um certo saber jurídico, mas é uma simples
aparência, porque eles conhecem artigos e parágrafos sem lhes ter compreendido
exatamente o conteúdo'.
Os querelômenos surpreendem muitas vezes pela limpidez de sua consciência, pela
memória intacta, por uma lógica aparentemente impecável, pelo conhecimento da
lei, de maneira que podem enganar advogados e juizes, o que, fomentando o seu
delírio, cria ao mesmo tempo graves perigos à Justiça. Mas à medida em que o
mal se agrava, revelam-se também pelo seu comportamento.
"Efetivamente, ao expor as razões em que estejam as suas idéias estes
indivíduos não raro entram numa fase emotiva e de excitação mais ou menos viva
que tem sido chamada hipomaníaca, logorréica e graforréica, mas que, no
entanto, na maior parte dos casos, conseguem dominar, enquanto não explodem em
manifestações clamorosas, apelando para a opinião pública tornando-se
freqüentadores das ante-câmaras dos magistrados e diretores de jornais,
chegando a exaltações perigosas (Enrico Altavila, Psicologia Judiciária, 3ª
Edição, Tradução de Fernando de Miranda, Armênio Amado, Coimbra, 1982, vol. II,
237/238).
Seja como for, e por mais que sinta injustiçado, deve o juiz permanecer sereno.
No dizer de Hermógenes, “quando é grande a nossa fé, Deus faz o milagre de
transformar em flores os punhais que nos atiram (Mergulho da Paz, 20ª Edição,
Record, p. 121)".
Em um país como o Brasil atual, de profunda injustiça social, todos vêem todos
como desonestos e incompetentes e parte da imprensa (4º poder) não está
preocupada em informar correlamente. Destarte, fica muito fácil um Juiz honrado
ser execrado publicamente, ainda que tenha cumprido fielmente a Constituição
Federal, que ele não elaborou.
"No exercício do poder jurisdicional, o juiz tem ampla Liberdade de
decidir. Sujeita-se apenas à Constituição, às leis e à sua consciência. É
absolutamente autônomo e livre de quaisquer vínculos hierárquicos. No quadro
descrito, o Poder Judiciário, no exercício das suas atribuições, não presta
vênia aos demais Poderes, nem deles as recebe, mas apenas à Constituição e às
leis que com ela se conformem. Cinge-se a fazer justiça sempre que,
concretamente, seja invocada a tutela jurisdicional do Estado". (Ministro
PÁDUA RIBEIRO, in Soberania do Poder Judiciário, publicado no Informativo
Jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, Tribunal Superior de Justiça,
vol. 3, nº 2, 1991).
Em sua famosa monografia sobre "O Juiz, a Função Jurisdicional", após
examinar em profundidade o tema sobre a autonomia do Judiciário, o Ministro
Mário Guimarães conclui com estas palavras: "A admissão do judiciário como
poder autônomo representa, por conseguinte, indeclinável garantia dos direitos
dos cidadãos, sem o qual não é possível o florescimento da vida democrática e
assinala um marco avançado na evolução jurídica dos povos".