PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº P628954/2017
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE URBANISMO E MEIO AMBIENTE - SEUMA
ASSUNTO: ALTERAÇÃO DE PROJETO ARQUITETÔNICO
EMENTA: PROJETO ORIGINAL APROVADO EM MEADOS DE 2012. HABITE-SE INDEFERIDO EM RAZÃO DE DIVERGÊNCIAS ENTRE O PROJETO APROVADO E A OBRA EXECUTADA. REQUERIMENTO DE ALTERAÇÃO DE PROJETO PARA FINS DE REGULARIZAÇÃO. ALGUMAS DIVERGÊNCIAS SÃO PASSÍVEIS DE DESFAZIMENTO SEM COMPROMETIMENTO DA ESTRUTURA DA EDIFICAÇÃO. OUTRAS DIVERGÊNCIAS NÃO SÃO PASSÍVEIS DE DESFAZIMENTO. EXTRAPOLAMENTO DO ÍNDICE TAXA DE OCUPAÇÃO DO SUBSOLO EM PERCENTUAL DE 4%. ÁREA ACRESCIDA DE 232,80M² NO SUBSOLO, PARA INSTALAÇÕES TÉCNICAS E DE USO COMUM. DIVERGÊNCIA TOLERÁVEL. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. EM RAZÃO DA EXECUÇÃO ANTERIOR AO PRÉVIO LICENCIAMENTO QUE IMPLICOU NO EXTRAPOLAMENTO DE 4% DA TAXA DE OCUPAÇÃO DO SUBSOLO, APLIQUE-SE COMPENSATÓRIA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA OUTORGA ONEROSA DE ALTERAÇÃO DE USO.
Trata-se de processo administrativo de alteração de projeto arquitetônico requerido pela empresa HESA 140 – Investimentos Imobiliários Ltda. junto a SEUMA tendo por objeto a alterações ocorridas durante a execução de obra localizada na Rua Tibúrcio Cavalcante, 170.
Por meio do requerimento de fl. 53/58 do Processo 12662017 SEUMA, a interessada relata e comprova que quando adquiriu o imóvel objeto do presente pleito, adquiriu também o projeto desenvolvido pela Potenza Construções Ltda. já protocolado junto a SEUMA e em vias de aprovação do respectivo alvará de construção, conforme faz prova a cópia do alvará nº 012230, acostado às fls. 22 do Processo 12662017 - SEUMA, originalmente emitido em nome de POTENZA CONSTRUÇÕES LTDA, bem como a cópia da matrícula 38.891 do 4º CRI, acostada às fls. 10/14 do referido processo, destacando-se o R-3/38.891 que faz referência a venda do imóvel a HESA 140 – Investimentos Imobiliários Ltda em Novembro de 2012 e o R-4/38.891, referente a Incorporação Imobiliária.
Informa que quando da execução da obra e da elaboração dos projetos executivos complementares do edifício surgiu a necessidade de promover algumas alterações nas áreas técnicas dos subsolos, inclusive para atender a exigências das concessionárias de serviços públicos, especialmente, energia, telefonia, água e esgoto.
As alterações foram executadas sem o prévio licenciamento.
Apenas após a conclusão da obra e, por ocasião da vistoria realizada no processo 39.143/2016, referente a solicitação do HABITE-SE, a equipe de fiscalização da Secretaria Executiva Regional II, constatou a existência de divergências entre o projeto aprovado e a obra executada que inviabilizaram a expedição do HABITE-SE. As divergências identificadas pela SER II, conforme relato do interessado, podem ser assim resumidas:
1. Em relação ao recuo do subsolo 2, lateral norte, consta no projeto a medida de 5,50m, ocorre que o mesmo foi reduzido a zero;
2. Em relação ao recuo do subsolo 2, lateral leste, consta no projeto a medida de 0,56m, ocorre que o mesmo foi reduzido a zero;
3. Em relação ao recuo do subsolo 1, frente pela Rua Tibúrcio Cavalcante, no projeto consta 8,10m e na obra 4,31m;
4. Em relação ao recuo do subsolo 1, frente pela Avenida da Abolição, consta no projeto 6,12m, ocorre que o mesmo foi reduzido a zero;
5. Em relação ao recuo do subsolo 1, lateral leste, consta no projeto a medida de 0,56m, ocorre que o mesmo foi reduzido a zero;
6. Em relação ao alinhamento predial, consta no projeto 5,00m, ocorre que a fiscalização constatou um afastamento de apenas 3,50m.
7. Em relação aos equipamentos acrescidos, a fiscalização identificou: casa de bombas com 16,78m²; centro de medição com 17,67m²; sala de gerador com 40,89m²; subestação com 57,91m²; cisternas com 29,92m²;
8. Alteração da localização e posicionamento das vagas, sem alteração da quantidade;
9. Guarita modificada com área de 64,68m², quando o projeto previa apenas 24,72m²;
10. Alteração no deck da churrasqueira.
A despeito da longa lista de alterações, a empresa postulante pondera que a área total do empreendimento é de 14.324,31m², representando as alterações apenas 232,80m², distribuídos todas na área comum e, em sua maior parte, relacionadas a alteração de área técnica, motivadas em sua maior parte por exigências de concessionárias de serviços públicos.
Aduz, ainda, em sua defesa, que as alterações não representaram aumento nos pavimentos tipo, de modo que não representaram ganho financeiro para o empreendedor, mas custos adicionais a obra, originalmente não previstos.
A SEUMA realizou vistoria no empreendimento, conforme Relatório de fls. 63/68, tendo sido constatadas divergências entre o projeto apresentado para análise e a execução in loco, o que implicou na solicitação de novos documentos.
As fls. 75, em análise da documentação apresentada a SEUMA constatou que as alterações do projeto podem ser assim resumidas:
1- Houve acréscimo do subsolo 1 em aproximadamente 155,00m².
2- Houve a acréscimo do subsolo 2, em aproximadamente 70,00m², para implantação da cisterna.
3- Houve acréscimo no pavimento térreo de uma churrasqueira, encostando nas divisas laterais, em aproximadamente 11,25m².
4- O recuo de frente pela Avenida da Abolição foi ocupada com a construção da sub-estação em uma área de 43,25m².
5- O recuo de frente pela Rua Tibúrcio Cavalcante, apresenta uma coberta de aproximadamente 60,00m². Foi apresentada uma planta, onde o interessado se compromete a demolir parte da coberta, deixando a mesma com 25,00m² que é a área máxima permitida.
6- Com as alterações a área total construída passou de 14.091,51m² para 14.324,31m².
7- A taxa de permeabilidade ficou reduzida de 32,01% para 29,14%.
8- A taxa de ocupação do subsolo passou de 58,58% para 64,00%.
Às fls. 81 dos autos, consta a informação de que o interessado justificou a construção da subestação e sua localização, nos seguintes termos:
(...) QUANTO AO ÍTEM Nº 04 DO DESPACHO DO TÉCNICO MARCOS MEDEIROS JÁ CITADO ÀS FLS 75, NO QUE DIZ RESPEITO A CONSTRUÇÃO DA SUBESTAÇÃO NO RECUO DE FRENTE (RECUO DE 5,00M), O INTERESSADO APRESENTOU ÀS FLS 77/78, PARTE DA NORMA TÉCNICA NT-C 003 DA COELCE ONDE NO ÍTEM 11.3-A, MENCIONA QUE ÁREA DE LOCALIZAÇÃO DA SUBESTAÇÃO DEVE ESTAR SITUADA DENTRO DA PROPRIEDADE PARTICULAR E O MAIS PRÓXIMO POSSÍVEL DO LIMITE DA VIA PÚBLICA.
OBS 01- A SUBESTAÇÃO SE ENCONTRA SITUADA NO ALINHAMENTO, DENTRO DO RECUO DE 5,00M, ENCOSTANDO NA DIVISA, COM 43,25M², DO PAVIMENTO TÉRREO PELA AV. DA ABOLIÇÃO (SUBSOLO PELA TOMADO DO NÍVEL QUE É A RUA TIBÚRCIO CAVALCANTE).
OBS 02-NO § 2º DO ART. 167, DA LEI 7987/1996 MENCIONA QUE OS ABRIGOS E CABINES EM GERAL, CUJA POSIÇÃO NO IMÓVEL NÃO SEJA PREFIXADA EM NORMA EXPEDIDA PELA AUTORIDADE COMPETENTE, DEVERÃO OBSERVAR OS RECUOS MÍNIMOS OBRIGATÓRIOS DO ALINHAMENTO E DO AFASTAMENTO.
O requerente foi, então, notificado para sanar as seguintes pendências, no prazo de 30 dias sob pena de indeferimento:
01. EXISTE ACRÉSCIMO NO SUBSOLO 1 EM APROXIMADAMENTE 155,00M², ULTRAPASSANDO A TAXA DE OCUPAÇÃO DE 60,00%, FICANDO COM 64,00%.
02. EXISTE ACRÉSCIMO NO SUBSOLO 2 EM APROXIMADAMENTE 70,0,00M², ULTRAPASSANDO A TAXA DE OCUPAÇÃO DE 60,00%, FICANDO COM 63,36%.
03. O RECUO DE FRENTE PELA RUA TIBÚRCIO CAVALCANTE, APRESENTA UMA COBERTA DE APROXIMADAMENTE 60,00M², ONDE NA NOVA PROPOSTA APRESENTADA, O INTERESSADO SE COMPROMETE A DEMOLIR A COBERTA, DEIXANDO A MESMA COM 25,00M² QUE É A ÁREA MÁXIMA PERMITIDA.
04. O RECUO DE FRENTE PELA AV. DA ABOLIÇÃO FOI OCUPADO COM A CONSTRUÇÃO DA SUBESTAÇÃO EM UMA ÁREA DE 43,25M, NÃO EXISTINDO DECLARAÇÃO DO ORGÃO COMPETENTE PARA QUE A MESMA FOSSE CONSTRUÍDA NESTE LOCAL, EMBORA TENHA SIDO APRESENTADO A NORMA TÉCNICA NT-C 003 DA COELCE, ONDE NO ÍTEM Nº 11.3-A, MENCIONA QUE A ÁREA DE LOCALIZAÇÃO DA SUBESTAÇÃO DEVA ESTAR SITUADA DENTRO DA PROPRIEDADE PARTICULAR E O MAIS PRÓXIMO POSSÍVEL DO LIMITE DA VIA PÚBLICA.
05. A TAXA DE PERMEABILIDADE FICOU REDUZIDA DE 32,01% PARA 29,14%. (MÍNIMA 30,00%)
O requerente apresentou, então, novos projetos e documentos, visando corrigir os pontos indicados pela análise da SEUMA ou justificar os que não seriam, sob sua ótica, passíveis de correção, às fls. 85/138.
A empresa interessada, em clara demonstração do interesse em regularizar o empreendimento, promoveu a correção dos projetos e corrigiu in loco o item 03 da notificação da SEUMA, referente a Guarita, remodelando a mesma e reduzindo a área construída de 60,00m² para 25,00m², que é a área máxima permitida. Bem como corrigiu o deck da churrasqueira, que antes estava colado ao muro do vizinho, foi deslocado em 1,50m, distância mínima exigida por lei, e remodelado, sendo regularizado. Alterações já aprovadas e executadas, conforme despacho de fls. 140 e relatório de vistoria de fls.149.
Quanto ao acréscimo de 155,00m² no subsolo 1 que implica em extrapolamento da taxa de ocupação do subsolo em 4%, além da impossibilidade de desfazimento sem danos potenciais a estrutura da edificação, pondera que o acréscimo, bem como a ocupação parcial do recuo, decorre de exigência nova da concessionaria de serviço público de energia elétrica de instalação de subestação com acesso independente pela Avenida da Abolição. Como a exigência foi posterior a execução dos subsolos e da torre, o único local viável para edificação da subestação foi o recuo de frente.
Pondera que esta construção ocupa 8,65m de extensão e a frente norte da avenida possui 30,00m com três segmentos de contenção: o da subestação que encosta no limite do passeio, e mais dois, sendo um de 12,66m com recuo de 5,06m e outro de 8,69m com recuo de 1 6,04m. Portanto o cálculo do recuo médio deste alinhamento resulta em 9.52 m, medida bastante acima do afastamento mínimo legal exigido (5,00m).
Além da subestação, o acréscimo na Taxa de Ocupação do Subsolo, deve-se a execução de Centro de medições (o projeto aprovado não contemplava local para a instalação dos equipamentos de medição individual de energia elétrica (relógios); Gerador; centro de Distribuição exigido pela Concessionária de Telefonia.
Quanto ao acréscimo de 70,00m² no subsolo 2 que implica em sobrepujamento da taxa de ocupação do subsolo em 3,36%, além da impossibilidade de desfazimento sem danos potenciais a estrutura da edificação, pondera que o acréscimo deve-se a necessidade de construção de cisternas e casas de bombas, recomendadas pela Concessionária de Água e Esgoto e que, por evidente equívoco, não foram previstos no projeto originalmente aprovado.
A interessada pondera, outrossim, que a Taxa de Ocupação do Subsolo é ultrapassada em apenas 4% e a Taxa de Permeabilidade em menos de 1%, diferença que, conforme alega, estaria dentro de um limite aceitável, não sendo tecnicamente possível, nem recomendável, por se tratar de área técnica, a demolição apenas da parte excedente, muito menos razoável a negativa do HABITE-SE ou a demolição de toda a edificação.
Tendo em vista que a legislação vigente no Município de Fortaleza não prevê nenhum percentual de tolerância de divergência entre a obra projetada e a executada, o Despacho de fls. 142 da SEUMA sugere que as modificações do projeto que não são passíveis de alteração pela via ordinária sejam analisadas pela PGM, bem como requer, caso as alterações sejam admitidas, que seja mensurada contrapartida em decorrência da execução de alterações da obra sem alvará, encaminhando os autos para cálculo pela SEINF.
Às fls. 145/146 Despacho da SEINF informando que o cálculo da contrapartida levou em consideração o terreno virtual que seria necessário a fim de regularizar as taxas que foram extrapoladas, chegando-se ao valor de R$ 473.279,24 (quatrocentos e setenta e três mil e duzentos e setenta e nove reais e vinte quatro centavos). Cálculo este não impugnado pelo requerente.
O processo foi, então, encaminhado a esta Procuradoria, sem parecer prévio da Assessoria Jurídica da SEUMA, para em suma, analisar a viabilidade de tolerar as divergências entre o projeto aprovado e a obra já executada, nos pontos não passíveis de aprovação administrativa por representarem desrespeito a taxa de ocupação do subsolo e a taxa de permeabilidade.
É o breve relatório. Passamos a opinar.
Segundo a dicção do art. 15 do Código de Obras e Posturas do Município (Lei nº 5530/81), é imprescindível a licença prévia da Edilidade para a realização de qualquer construção:
“Art. 15 – Em todo o Município de Fortaleza, as obras, particulares ou públicas, de construção ou reconstrução, de qualquer espécie, acréscimos, reformas, demolições, obras ou serviços nos logradouros públicos – em sua superfície, subterrâneos ou aéreos – rebaixamentos de meios-fios, sutamento em vias, aberturas de gárgulas para o escoamento de águas pluviais sob os passeios, aterros ou cortes, canalização de cursos d’água ou execução de qualquer obra nas margens de recursos hídricos, só poderão ser executadas em conformidade com as disposições desta Lei e da Legislação de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo e com a prévia licença da Prefeitura, ressalvado o disposto no artigo 19 desta Lei.” (grifos acrescidos)
Dita exigência, arrimada no Poder de Polícia e, em última instância, no interesse público, tem sua razão de ser não em mera condição formal de realização da obra, mas sim na garantia de que a construção a ser realizada se conforma às diretrizes de ordenamento urbano traçadas pelo Município. Nesse sentido, é oportuna a Lição de Hely Lopes Meirelles, para quem:
“No uso normal do poder de polícia administrativa, o Poder Público edita leis e baixa regulamentos especificadores do modo, forma e condições dos direitos e atividades particulares que interessem à coletividade. A essas normas administrativas ficam sujeitos todos os que venham a praticar atividade policiada administrativamente, dependendo o seu exercício de licença prévia da autoridade competente, licença essa, na linguagem administrativa denominada alvará.” (in Direito de Construir, 3ºed, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1979)”. (grifos acrescidos)
Observa-se, então, que toda construção ou reforma que se pretenda fazer deve sofrer a incidência de controle prévio do ente estatal, que, após a análise dos projetos de construção e reforma, emite sua aprovação, através das respectivas licenças; tudo isso em nome do bem-estar social. Não se trata, pois, de excesso de formalidade, mas sim de diligência legal com o objetivo de prevenir possíveis danos ao ordenamento urbano.
No caso em tela, conforme relato do interessado, devidamente comprovado pelos documentos acostados e manifestações técnicas da SEUMA, o projeto original foi devida e regularmente aprovado em meados do ano 2012, quando ainda era proprietária do bem a empresa Potenza Construções Ltda.
Ocorre que durante a execução da obra, a empresa interessada verificou a necessidade de acréscimo de instalações técnicas, quais sejam, cisternas, casa de bombas, gerador, entre outras.
Ora, diante da necessidade de alteração do projeto aprovado, a via legal e regular seria, antes da execução das alterações pretendidas, a submissão ao órgão licenciador de pedido de alteração de projeto, nos termos do art. 26, COPMF (Lei 5.530/1981).
Art. 26 – A execução de modificações em projeto aprovado, com licença ainda em vigor, que envolvam mudança da estrutura ou área de construção, somente poderá ser iniciada após sua aprovação.
§ 1º - A aprovação das modificações de projeto previstas neste artigo, que poderão ser parciais ou totais, será obtida mediante apresentação de requerimento acompanhado de:
a) Projeto anteriormente aprovado;
b) Projeto Modificativo.
§ 2º - Aceito o projeto modificativo, será lavrado e expedido termo aditivo do alvará de licença.
§ 3º - Somente serão aceitos projetos modificativos que não criem, nem agravem a eventual desconformidade do projeto anteriormente aprovado, com as exigências da nova legislação, se ocorrer.
§ 4º - Para os efeitos do prazo de validade do alvará de licença, prevalecerá sempre a data da expedição do alvará original.
Incidiu, pois, a parte em patente irregularidade em executar tais alterações sem a aprovação prévia.
Caso as alterações necessárias tivessem sido objeto de prévia análise pelo órgão municipal, possivelmente, existiram outras alternativas técnicas a instalação dos acréscimos relatados que não implicassem em extrapolamento dos índices urbanísticos.
No entanto, a referida via do licenciamento prévio e da adaptação e adequação da obra a legislação aplicável foi suplantada pelo interessado por sua conta e risco, não sendo justo, nem legítimo que tal erro passe impune.
Veja-se que não houve nenhuma iniciativa anterior do interessado em regularizar-se, ao contrário, o acréscimo de 232,80m² executados sem prévia licença nos subsolos apenas fora identificado por ocasião de vistoria prévia ao HABITE-SE, inviabilizando a expedição da referida licença.
Impossibilitado de obter o HABITE-SE e de fazer a entrega das unidades residenciais já vendidas, o empreendedor inaugurou tardiamente o pedido administrativo de alteração de projeto.
Tardiamente, explique-se, por já estar a obra totalmente concluída, o que implica em drástica redução das possibilidades práticas de adaptação da obra.
Ora, a área acrescida está distribuída nos dois subsolos da edificação, de modo que seria inviável exigir-se a demolição do que foi acrescido sem riscos de dano a edificação regularmente licenciada.
Por outro lado, as áreas acrescidas são de uso comum e efetivamente necessárias ao bom e regular uso da edificação, visto tratarem-se de áreas técnicas relacionadas ao abastecimento de água (cisternas), ao abastecimento de energia elétrica (subestação, centro de medição, sala do gerador).
O acréscimo dessas áreas não representa nenhum ganho efetivo para o empreendedor, o decréscimo, por sua vez, representaria sério prejuízo aos adquirentes e usuários das unidades, além de representar impacto no serviço de distribuição de energia elétrica, no que respeita a subestação, exigida pela concessionária, conforme detalhamento posterior.
De modo que a situação que se coloca para análise desta Procuradoria pode ser assim sintetizada: a obra foi concluída com uma pequena divergência do projeto inicialmente aprovado, não sendo as alterações, individual e isoladamente consideradas, passíveis de aprovação, por representarem desrespeito a taxa de ocupação do subsolo em 4% e a taxa de permeabilidade em quase 1%. Pergunta-se: é admissível a tolerância da referida divergência?
É público e notório que entre a elaboração do projeto e sua execução/implantação há sempre dificuldades e empecilhos que exigem, em alguma medida, adaptações.
Como já dito acima, o caminho adequado é o prévio licenciamento, o que não ocorreu no caso em liça.
Já concluída a edificação, cabe falar em tolerância a pequenas divergências ou sempre e em qualquer hipótese deve a administração municipal exigir a demolição e adaptação da edificação?
A legislação vigente no Município de Fortaleza não tem resposta pronta para tal questionamento. Ou seja, não há previsão legal de um percentual de tolerância admissível.
Rotineiramente, fala-se entre os fiscais e técnicos na área em “bom senso” da fiscalização, que não deve negar o HABITE-SE quando a divergência for desprezível, quase imperceptível.
No caso em tela não há que se falar em desprezibilidade. Foram acrescidos diversos equipamentos: subestação, sala de gerador, centro de medição, cisterna. Somando 232,80m² de área acrescida, com excesso em 4% da taxa de ocupação do subsolo e 1% da taxa de permeabilidade. Embora tal divergência seja de pequeno impacto em uma obra de mais de 14.000m² não é de se dizer que seja desprezível.
O interessado em sua defesa clama pela aplicação de tolerância da divergência em até 5%, o que em sua ótica, seria razoável, reportando-se ao Código Civil.
É fato que o Código Civil prevê uma tolerância na divergência das dimensões e áreas de bens imóveis, o que popularmente ficou conhecido como “erro de trena”, ocorre que como se verá tal dispositivo é específico para regular os contratos de compra e venda.
Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço.
§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio.
§ 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso.
§ 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus.
Regulamenta-se no dispositivo supra a venda ad corpus e ad mesuram, esclarecendo-se os efeitos da divergência tolerável em ou e outro caso. O dispositivo não se refere a uma tolerância de discrepância de índices urbanísticos, regulados por normas cogentes de direito público.
No que se refere a pequenas divergências entre projeto e obra, repise-se, a legislação do Município de Fortaleza não prevê nenhum percentual de tolerância, restando prevista expressamente apenas a hipótese de indeferimento do Habite-se, embargo da obra e demolição parcial ou total da mesma.
A despeito disso, diante do reclamo do empreendedor que se aplique um percentual de tolerância de 5%, fez-se pesquisa na legislação correlata de outros Municípios brasileiros, localizando-se alguns casos em que há previsão expressa de tal percentagem.
Exemplificativamente, podem ser citadas a legislação do Distrito Federal e do Município de São Paulo, a seguir transcrita:
DISTRITO FEDERAL - LEI Nº 1.172, DE 24 DE JULHO DE 1996
Art. 16, - Atendido o disposto no artigo anterior e após vistoria do imóvel, a Carta de Habite-se será expedida no prazo máximo de dois dias.
§ 1º - Serão aceitas eventuais divergências de até 5% nas metragens lineares entre o projeto aprovado e a obra construída, desde que a metragem quadrada do compartimento não seja inferior a 5% à do projeto aprovado, e que não seja alterada a área total da edificação constante do Alvará de Construção.
SÃO PAULO - LEI Nº 11.228, DE 25 DE JUNHO DE 1992.
3.9.2 Poderão ser aceitas pequenas alterações que não descaracterizem o projeto aprovado, nem impliquem em divergência superior a 5% (cinco por cento) entre as metragens lineares e/ou quadradas da edificação, constantes do projeto aprovado e as observadas na obra executada.
Este não é, contudo, o caso do Município de Fortaleza. Diante da ausência de previsão expressa nesse sentido, não há como simplesmente se aplicar um dispositivo legal que previamente estabelece um percentual de tolerância.
Pergunta-se, então, diante da ausência de dispositivo legal expresso, no caso concreto, qual a medida a aplicar-se?
Como já amplamente relatado, por ocasião do Habite-se, constatou-se que a obra executada divergia parcialmente do projeto licenciado.
Na busca pela regularização, o empreendedor adaptou e reconstruiu a Guarita, reduzindo a área de 60m² para 25m², bem como reconstruiu o deck da piscina, promovendo o deslocamento de 1,50m, adequando tais áreas às exigências legais.
Pende, entretanto, irregularidade quanto a construção de áreas técnicas relacionadas ao abastecimento de água (cisternas), ao abastecimento de energia elétrica (subestação, centro de medição, sala do gerador), visto que localizadas no subsolo da edificação suplantaram em 4% a taxa de ocupação do subsolo e 1% a taxa de permeabilidade. Quanto a subestação, acresça-se o fato de estar no recuo.
Ora, não há dúvida de que toda a área técnica descrita é fundamental para o regular funcionamento do edifício em questão, com diversas unidades residenciais, na medida em que se mostram necessários, quiçá indispensáveis ao fornecimento de energia elétrica e água as unidades.
De modo que nem o Município, enquanto ente planejador da cidade, nem os munícipes, em especial os usuários da edificação, teriam qualquer benefício com a exclusão compulsória de tais áreas. Suportariam, sem dúvida, prejuízos de diversas ordens.
Some-se a isto o fato de que as instalações encontram-se no subsolo. Trata-se de 155m² no subsolo 1 e 70m² no subsolo 2. Embora a parecerista não tenha capacidade técnica para avaliar o impacto que o desfazimento destas áreas de subsolo podem representar para solidez e segurança do restante da estrutura, para o homem médio, a demolição parcial de áreas no subsolo trazem real impacto a estrutura da edificação.
Diante de tal fato, exsurge novamente a constatação de que nem o Município, enquanto ente planejador da cidade, nem os munícipes, teriam qualquer benefício com a exclusão compulsória de tais áreas, havendo grandes chances de um enorme prejuízo para todos os atores envolvidos, em especial, para o empreendedor e para os adquirentes.
Há que se avaliar o impacto do sobrelevamento da taxa de ocupação do subsolo de 60% para 64%, bem como da redução da taxa de permeabilidade de 30% para 29,14%.
Tais índices urbanísticos estão definidos na Lei de Uso e Ocupação do Solo do Município de Fortaleza (Lei 7987/96) e têm o objetivo de limitar o exercício do direito de construir, impedindo que a edificação ocupe a totalidade do terreno, resguardando a permeabilidade do solo, indispensável ao ciclo da água; garantindo um afastamento das divisas do imóvel, para fins de planejamento...
CXVIII - TAXA de OCUPAÇÃO do SUBSOLO: é a percentagem da área do terreno ocupada pela maior área de pavimento de subsolo;
CXIX - TAXA de PERMEABILIDADE - é a relação entre a parte do lote ou gleba que permite a infiltração de água, permanecendo totalmente livre de qualquer edificação e a área total dos mesmos;
Conforme a zona em que se localiza o imóvel, a legislação aplicável estabelece os seguintes índices máximos para o imóvel em questão: taxa de ocupação de subsolo de 60% e taxa de permeabilidade de 30%.
É despiciendo dizer que os índices são estabelecidos como limites, não podendo, em regra, ser suplantados. Mas por tudo o que já foi dito, estando a obra já concluída e sendo a demolição, ainda que parcial, extremamente onerosa, tem-se que verificar a possibilidade de suportar tal excesso e em que termos.
Uma luz bastante interessante nos trouxe o advogado, professor e Mestre em Direito pela UFSC, Pedro de Menezes Niebuhr, em seu artigo intitulado A tolerabilidade justificada de desconformidades construtivas.
Analisando situações similares a do presente processo, o autor, com base nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, propõe alguns critérios para interpretar a legislação urbanística.
Em situações excepcionais, ao Poder Público (enquanto titular da prerrogativa de conformar o uso da propriedade à boa ordenação da cidade) é atribuída competência para interpretar e aplicar sistemática e teleologicamente a legislação urbanística. Para além de fazer uma interpretação de estrita legalidade, o Poder Público deve: 1) examinar a natureza da exigência descumprida;
2) avaliar a dimensão/repercussão da violação; e 3) apurar o limite de tolerabilidade à desconformidade.
Partindo desta ótica, a norma aqui descumprida, referente aos índices urbanísticos, situa-se entre aquelas decorrentes do ordenamento da cidade em seu conjunto, conforme clássica lição de Hely Lopes Meirelles.
A pergunta que agora devemos responder é se a desconformidade, no caso concreto, é capaz de comprometer a existência da limitação. Em outras palavras, o sobrepujamento de 4% da taxa de ocupação do subsolo e de menos de 1% da taxa de permeabilidade comprometem no caso concreto o bem jurídico tutelado pela limitação.
A taxa de ocupação do subsolo, combinada com a taxa de ocupação do solo, taxa de permeabilidade, índice de aproveitamento, recuos vão limitar e conformar o exercício do direito de construir, a fim de compatibilizá-lo com o planejamento da cidade.
Não nos parece que o excesso, no presente caso, seja de tal monta que tenha comprometido o planejamento da cidade ou trazido impactos negativos a qualquer outro bem jurídico tutelado.
Nesse ponto, tem lugar a terceira operação interpretativa: apurar o limite de tolerabilidade à desconformidade. Se a ordem de desfazimento da construção não se mostrar necessária para garantir a finalidade pública da limitação em discussão, a exigência de seu cumprimento (que redundaria no desfazimento, mesmo que parcial da obra) pode se mostrar excessiva, desproporcional, desequilibrada ao fim que se destina.[1]
Observando-se que no caso concreto a edificação observa quase todos os índices urbanísticos, não chegando a esgotar o potencial construtivo máximo; considerando, ainda, que o excesso da taxa de ocupação do subsolo e da taxa de permeabilidade são pequenos e referem-se exclusivamente a acréscimos de área técnica indispensável ao bom funcionamento do residencial; considerando, especialmente, que a demolição das áreas acrescidas ao subsolo não traria benefício algum ao Município, com base no princípio da proporcionalidade, parece-nos tolerável tal excesso.
Observa-se a existência de precedentes judiciais nesse sentido, afastando a ordem de demolição quando ausente a comprovação de ofensa a qualquer interesse público ou valor jurídico relevante.
"ADMINISTRATIVO. AÇÃO DEMOLITÓRIA. CONSTRUÇÃO DE ANEXO RESIDENCIAL SEM A OBSERVÂNCIA À LARGURA DO PASSEIO PÚBLICO E DO AFASTAMENTO FRONTAL E EM RELAÇÃO À CONSTRUÇÃO PRINCIPAL DO MESMO TERRENO. HARMONIZAÇÃO DA EDIFICAÇÃO COM A SITUAÇÃO URBANÍSTICA CONSOLIDADA NO TEMPO. AUSÊNCIA DE OFENSA A QUALQUER INTERESSE PÚBLICO OU VALOR JURÍDICO RELEVANTE. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE SOBRE IRREGULARIDADES DE NENHUM POTENCIAL OFENSIVO. RECURSO DESPROVIDO."(9)
"DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE PRECEITO COMINATÓRIO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO DA AÇÃO. APRECIAÇÃO CONJUNTA. RECURSO REFERENTE À POSSIBILIDADE DE SE DEMOLIR OU NÃO ÁREA DE 1 M² (UM METRO QUADRADO) QUE NÃO OBEDECE AO RECUO FRONTAL EXIGIDO PELO PODER PÚBLICO. INADMISSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PREJUÍZOS DO APELADO SUPERIORES AOS BENEFÍCIOS A SEREM OBTIDOS PELA COLETIVIDADE. PRELIMINAR REJEITADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Considerando-se que a preliminar de nulidade da sentença se confunde com o mérito da ação, deve ser apreciada conjuntamente com ele. 2. Não há que se falar em demolição de construção que avança 1 m² (um metro quadrado) sobre área de recuo frontal, desde que inexista dano ambiental, bem como risco à segurança ou à saúde de terceiros e que o prejuízo do proprietário do imóvel seja em muito superior ao benefício obtido pela coletividade. Aplicação do princípio da proporcionalidade."[2]
"DEMOLITÓRIA. Construção de garagem com recuo frontal e lateral. Alegação de desobediência à legislação municipal. Ausência de juntada da legislação local. Edificação interna do imóvel não comprovada. Pleito demolitório. Medida inadequada. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Sentença mantida. Recurso não provido. (...)
VOTO
Há que se adequar o deferimento do pedido demolitório aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Eventual edificação levada a efeito não altera coisa comum, tendo sido realizada no bem de propriedade da ré e, ainda que tenha sido feita sem as diretrizes municipais, a sua permanência em nada prejudica ao município, não interferindo no bem-estar da coletividade."[3]
"DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL DE DECISÃO MONOCRÁTICA. AÇÃO DEMOLITÓRIA. CONSTRUÇÃO DE COLÉGIO. ÍNFIMA INOBSERVÂNCIA EM RELAÇÃO AO RECUO. SITUAÇÃO CONSOLIDADA HÁ MAIS DE 26 ANOS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS. AGRAVO REGIMENTAL IMPRÓVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. (...)
V - Cumpre salientar que não se está aqui defendendo a realização de construções em inobservância às regras do Código de Obras e Posturas do Município de Fortaleza, mas, sim, aplicando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para uma situação consolidada há muitos anos e respeitando o direito à educação, que se encontra previsto expressamente na Constituição Federal. (...)"[4]
Em especial, é relevante a informação trazida pelo interessado e confirmada pela equipe técnica do Município de que as alterações não representaram aumento nos pavimentos tipo, de modo que não representaram ganho financeiro para o empreendedor, mas custos adicionais a obra, visando a atender a demandas de concessionárias de serviços públicos e um melhor uso da edificação, no que respeita a fornecimento de água e energia.
No caso em liça, há ainda a peculiaridade referente a subestação.
Conforme relato devidamente comprovado pelo interessado, há época da aprovação do projeto e expedição do alvará de construção, quando em vigor a norma técnica NT-003/2011 R-02 (Anexo I), estabelecia-se que empreendimento no porte deste deveriam ser conectados à rede externa de baixa tensão, utilizando-se, pois, de subestação aérea.
Ocorre que em dezembro de 2012 entrou em vigor nova norma técnica NT-003/2011 R-03 (Anexo III) da COELCE exigindo a criação de subestação abrigada. A referida norma técnica prescreve, ainda, que a área reservada para localização da subestação deve estar situada dentro da propriedade particular e o mais próximo possível da via pública.
Sendo a exigência posterior a aprovação do projeto, de modo que não seria exigível ao interessado a previsão de área para instalação de subestação abrigada, é tolerável que a mesma tenha sido construída no recuo da edificação.
Observe-se que a mesma possui área de apenas 43,25m², sendo o seu impacto, caso existente de fato, infinitamente menor que o benefício trazido. Esclareça-se, ademais, que o benefício trazido pela subestação abrigada não se restringe aos usuários do empreendimento, mas beneficia a toda a coletividade, visto que a referida subestação, após construída, é transferida a concessionária do serviço público, para atender ao fornecimento de energia próprio e de outros consumidores, conforme consta do Termo de Transferência firmado com a concessionária, cópia às fls. 137.
Por todo o exposto, entende-se que, conforme as peculiaridades do caso concreto, a divergência entre o projeto aprovado e a obra executada deva ser tolerada, não sendo proporcional, nem eficiente requerer a demolição das áreas acrescidas.
Ocorre que, à medida que o empreendedor extrapolou os índices urbanísticos naturalmente previstos para a zona em que se localiza o imóvel, deve compensá-los.
As modificações da obra analisada, ao representarem extrapolamento, ainda que pequeno, dos índices urbanísticos, geraram para o empreendedor um ganho, uma valorização ou uma melhor forma de fruição do bem, em detrimento de uma limitação genérica. Tal ganho deve sim ser compensado.
Nesse ponto, somos pela aplicação analógica da Lei 10.335/2015 alterada pela 10.431/2015, que regulamenta o instrumento da outorga onerosa de alteração de uso.
Ora, a referida legislação prevê que deverá ser aplicada a outorga onerosa de alteração de uso em toda aprovação de projeto arquitetônico que se utilizar das alterações das normas de uso e ocupação do solo em vigor (art.3º, da Lei 10.335/2015).
A Lei 10.431/2015 acresceu o parágrafo sexto ao art. 2º para fins de admitir a aplicação da outorga de alteração de uso para edificações de uso residencial com área de construção computável igual ou superior a 10.000m² (dez mil metros quadrados), conforme disposto no art. 197, inciso II, da Lei Complementar nº 0062, de 02 de fevereiro de 2009.
Desta feita, embora o caso não se trate de aprovação de projeto, mas de requerimento de alteração de projeto com obra já concluída no qual houve pequena extrapolação dos índices urbanísticos, é exigível o pagamento da outorga, com base no art. 6º e seguintes da Lei 10.335/2015, alterada pela Lei 10.431/2015.
Por todo o exposto, entende-se que, conforme as peculiaridades do caso concreto, a divergência entre o projeto aprovado e a obra executada deva ser tolerada, não sendo proporcional, nem eficiente requerer a demolição das áreas acrescidas.
Entendemos, regular a incidência da outorga, incumbindo ao interessado o pagamento do valor compensatório de R$473.279,24 (quatrocentos e setenta e três mil e duzentos e setenta e nove reais e vinte e quatro centavos), descrito nos cálculos de fls. 145/146, em razão do excesso de 4% da taxa de ocupação do subsolo e 0,86% da taxa de permeabilidade.
Caso o presente parecer seja aprovado pelas instâncias superiores, deve ser o interessado notificado para requerer o Habite-se junto a SER II, devendo o requerimento ser instruído com cópia deste parecer, de modo que as divergências referente a Taxa de Ocupação de Subsolo, Taxa de Permeabilidade e ocupação do recuo pela subestação não inviabilizam a expedição do habite-se.
Paralelamente, deve o processo retornar a SEUMA, para celebração de termo de compromisso e pagamento da compensatória decorrente da aplicação da outorga onerosa de alteração de uso, condição prévia a expedição do Habite-se.
É o parecer, S. M. J.
À consideração superior.
Fortaleza, 20 de abril de 2017.
Fernanda Maria Diógenes de Menezes Oliveira
Procuradora do Município
Matrícula 55.438-1-0 – OAB(CE) 15775
[1] NIEBUHR, Pedro de Menezes. A tolerabilidade justificada de desconformidades construtivas.
[2] TJPR, AC 0593800-9, Rel. Des. José Marcos de Moura, j. 22.03.2011. Grifo acrescido.
[3] TJSP, APL 0000449-47.2010.8.26.0247, Rel. Des. Peiretti de Godoy, j. 12.02.2014. Grifo acrescido.
[4] TJPI, Reex 201300010060143, Rel. Des. Oton Mário José Lustosa Torres, j. 17.12.2013. Grifo acrescido.