CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO NA JUSTIÇA DO TRABALHO

FRANCISCO DE CARVALHO MARTINS

Juiz do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª região | Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará

O processo trabalhista não abriga, em seus dispositivos, a ação de consignação em pagamento e, para sua utilização, aplica-se subsidiariamente o Código de Processo Civil, arts. 890 a 900, por força do que dispõe o art. 769 do Texto Consolidado.

Dentre as hipóteses de consignação em pagamento previstas em lei (Código Civil arts. 972 a 984, Código Comercial art. 204 e art. 437 e Lei do Inquilinato art. 67), interessam à Justiça do Trabalho aquelas referentes à resistência, à ausência do credor, e aquela em que não é certo o credor da obrigação.

Interessa ainda à Justiça Laboral apenas a consignação de quantia certa, e não aquela que se destina à entrega de coisa.

A ação de consignação em pagamento mais comum na Justiça do Trabalho é aquela que se funda na resistência do credor em receber a quantia que o devedor lhe julga devida. O devedor, para não incidir em mora, há de consignar o valor que julga devido no primeiro dia após os prazos estabelecidos no art. 477, § 6°. Também, para não cair em mora, consigna o devedor na hipótese de ausência.

A consignação em pagamento quanto ao credor ou credores incertos, ocorre notadamente nos casos de sucessão, em virtude do falecimento do titular do crédito, devendo ser obedecidos os dispositivos da lei civil e aqueles da lei n° 6.858/80. O art. 895 do CPC determina que sejam citados os que disputam a legitimidade para receber o pagamento, para provarem, em juízo, o seu direito.

As modificações introduzidas pela lei n° 8.951, de 13 de dezembro de 1994, criando, no art. 890 do CPC, os parágrafos 1° a 4°, pouca relevância têm no processo laboral. De fato, às empresas, que são as consignantes naturais, interessa não só a extinção da obrigação, mais também, e principalmente, a homologação judicial do pagamento.

Sendo a celeridade um dos pilares básicos do processo trabalhista, as modificações introduzidas nos arts. 893, 896 e 897 do Código de Processo Civil, pela já mencionada Lei n° 8.951/94, produzem o efeito desejado na ação laboral.

Com a modificação introduzida no art. 893 do CPC foi, de inicio, estabelecida a obrigatoriedade de depositar a quantia certa no prazo de cinco dias, a contar da intimação do promovente do deferimento da inicial. No diploma adjetivo anterior, tal obrigatoriedade não se fazia clara e, sem o depósito obrigatório da quantia, o devedor intentava a ação sem comprometer a parte de seu patrimônio representada pela quantia consignada. Ressalte-se que a diversidade de procedimentos adotados pelo Srs. Juizes, uns determinando o depósito da quantia e outros não fazendo tal determinação, causavam prejuízo às partes e à própria credibilidade do instituto.

Atualmente, a não efetivação do depósito no prazo da lei, implica na extinção do processo sem julgamento de mérito, de acordo com o art. 267, IV, do CPC. Para Carreira Alvim, a extinção se dá com base no art. 267, XI, do diploma adjetivo.

Feito o depósito e citado o credor, cabe ao mesmo levantar o valor depositado ou oferecer resistência .

O
art. 896 do CPC, que teve o seu caput modificado e que recebeu um parágrafo único, determina que parâmetros devem ser obedecidos na contestação. Há de ser ressaltada a mudança do prazo em que a contestação deverá ser apresentada pois, tendo sido suprimida a expressão "a contestação será oferecida no prazo de 10 (dez) dias, contados da data designada para o recebimento", deverá ser obedecido o prazo de 15 (quinze) dias, geral para as contestações, conforme disposto no art. 297 do CPC.

A nós interessa, de maneira singular, o que dispõe o inciso IV e o parágrafo único do já mencionado artigo 896. Na contestação, o réu poderá alegar que o depósito não foi integral, mas, nesse caso, é obrigação do réu indicar o montante que entenda devido, não sendo aceita a simples recusa não fundamentada e sem a indicação do quantum debeatur

Em estudo mais profundo do art. 896, inciso IV e parágrafo único, do CPC, conclui-se que esses novos dispositivos trazem grande avanço ao transformar a ação de consignação em pagamento em ação dúplice, tornando dispensável a reconvenção. Esta é a observação feita por doutrinadores, que assim se manifestam:

"A natureza dúplice da ação de consignação em pagamento arenas torna desnecessária a utilização da reconvenção". César P. S. Machado Jr.

"Daí considerar-se agora inserida a ação consignatória entre os judícia duplícia, sem qualquer necessidade de reconvir o credor que se afirme com o direito a mais de que foi ofertado (insuficiência). Basta fazer a alegação e precisar o quantum de que se reputa credor, o que valerá como baliza para o julgamento que poderá vir se tiver razão". Cândido Rangel Dinamarco.
No novo caput do art. 897 do CPC foi introduzida, pela Lei 8.951/94, a locução "e ocorrentes os efeitos da revelia", inexistente no texto original.

Sobre os efeitos da revelia, é importante a lição de Humberto Theodoro
Júnior: "A inovação introduzida pela Lei n° 8.951/94 consistiu na advertência de que não basta a falta de contestação. Para que seja julgado procedente o pedido é necessário que tenham ocorrido os efeitos da revelia em torno dos pressupostos do pagamento por consignação. É que, mesmo não havendo resposta do réu, a inicial pode veicular, por seus próprios termos, fatos que, por si, não justificam a pretensão do autor. Malgrado, portanto, a inércia do demandado, não está o Juiz autorizado a pronunciar, desde logo, o decreto de procedência da ação".

Em brilhante sentença proferida pela 18a Junta de Conciliação e Julgamento de Brasília, proposta pelo Dr. Antonio Umberto de Souza Júnior, Juiz do Trabalho Substituto no processo 18-0278/96, proferida em 30 de abril próximo passado o magistrado propôs ser decretada a carência de ação por falta de interesse de agir por parte da autora, e a extinção do processo sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, VI e § 3°, do CPC. Tal decisão foi proferida em ação de consignação em pagamento, em que foi revel o réu.

Fundamentou a proposta de sentença do eminente Juiz, em síntese, o fato de haver sido ajuizada pelo réu, em data anterior reclamação objetivando, entre outras, o recebimento da parcela consignada. É exemplo típico onde houve a revelia, mas não ocorreram os seus efeitos.

O parágrafo único do art. 897 do CPC, mesmo em sua redação original, já autorizava ao magistrado a proceder o julgamento antecipado da lide, de acordo com o art. 330 do CPC. Se tal fato não ocorria no império do diploma anterior, se devia unicamente à eventual ausência do depósito da quantia consignada, o que hoje não mais ocorre, tendo em vista o disposto no art. 893, I, da nova lei adjetiva.

É conveniente acrescentar ser desnecessária a realização de audiência de conciliação, que tantas vezes é motivo de requerimento de antecipação com a finalidade de celebrar "acordos".

Importantíssima foi a modificação ocorrida em virtude da introdução ao art. 899, de seu parágrafo 1°. Como determina o dispositivo, não concordando o credor com o depósito feito, manifestada legalmente sua insuficiência poderá o credor levantar o valor depositado, sem prejuízo do prosseguimento do feito, quando será apurada a veracidade do que articulou o réu em sua contestação. A inovação é brilhante já que põe termo à cômoda situação em que ficava o consignante na versão original onde, mesmo que este efetuasse o depósito, o consignado era compelido a esperar o julgamento da lide para. somente então, requerer a liberação da quantia consignada.

Ocorria em inúmeros casos nos quais o consignado por sua hipossuficiência econômica, era pressionado a aceitar o valor consignado, abrindo mão de direitos que tinha ou julgava ter, premido pela necessidade de receber.

Também de relevância é o disposto no novo parágrafo 2° do art. 899, do CPC. Como já visto, dispensada a reconvenção, vencido o autor, é justo que tenha sido estabelecido que a sentença proferida valerá como título executivo, facultado ao credor promover a execução nos mesmos autos.

É de salientar que a sentença proferida na hipótese do art. 897, extingue a obrigação em relação às parcelas especificante consignadas. No que diz respeito às hipóteses do art. 899, as obrigações são extintas para as parcelas especificamente consignadas quando do levantamento pelo réu da quantia depositada; no que diz respeito à hipótese do art. 899, § 2°, as obrigações que estão compreendidas no valor considerado insuficiente no depósito somente serão extintas pelo seu pagamento, caso considerada procedente a alegação de insuficiência de depósito.

Em uma visão crítica, pode-se afirmar que as modificações introduzidas nos arts. 890 a 900 do CPC, pela Lei n° 8.951, de 13 de Dezembro de 1994, vieram resolver muitos problemas que se verificavam na Justiça Trabalhista.

A exigência do depósito da quantia consignada, além de uniformizar o procedimento a ser adotado pelas Juntas, força o devedor a comprometer a parte de seu patrimônio que corresponde à quantia que julga devida. Era fato costumeiro as empresas, com a finalidade de evitar a homologação sindical, ou aquelas realizadas nas Delegacias Regionais do Ministério do Trabalho, intentarem ação de consignação em pagamento, sem efetuar o depósito da quantia consignada, requererem a antecipação da audiência de conciliação a celebrar acordo com o obreiro. Com tal procedimento, as empresas passavam a ter homologação judicial em relação às parcelas devidas ao empregado sem comprometer, mesmo por poucos dias, parcela alguma de seu patrimônio. Ao trabalhador, iludido em sua boa fé, restava conformar-se com a quantia que lhe era oferecida.

A inexigibilidade de reconvenção esculpida no parágrafo único do art. 896 do CPC, combinada com a possibilidade de execução conforme previsto no art. 899,II, do mesmo diploma, representam notável economia.

O julgamento antecipado da lide, sem a necessidade de realização de
audiência, torna célere o processo, com inegável beneficio para as partes.

Tem-se ainda que a inovação introduzida pelo art. 899,I, atende ao interesse do consignado e corresponde, na prática, ao pagamento, na primeira audiência, das parcelas incontroversas, conforme previsto no art. 467, consolidado.

Bibliografia:

1. Theotonio Negrão -."Código de Processo Civil" - 24a edição -1993 - Malheiros Editores.

2. Theotonio Negrão -"Código de Processo Civil" - 26a edição - 1995 - Editora Saraiva.

3. Cândido Rangel Dinamarco -"A Reforma do Código de Processo Civil" - 2a Edição - Malheiros Editores.

4. Humberto Theodoro Júnior - "As Inovações no Código de Processo Civil" - 3a edição - Editora Forense.

5. J.J. Calmon de Passos - "Inovações no Código de Processo Civil" - 2a Edição -Editora Forense.

6. J.E. Carreira Alvim - "Código de Processo Civil Reformado" - 2a Edição - Editora Del Rey.

7. Humberto Theodoro Júnior - "Curso de Direito Processual Civil" - Volume I - 9a edição - Editora Forense.

8. César P. S. Machado Jr. - "A ação de consignação em pagamento na Justiça do Trabalho em face da Lei n° 8.951/94" - Revista LTr - ano 59 - Outubro de 1995.

9. Internet - Página da Amatra X - Endereço: http://www.solar.com.br/-amatra/ antumb2.htm1