BREVES
REFLEXÕES SOBRE O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA
WALBER
SIQUEIRA VIEIRA
Advogado
| Procurador Jurídico da Fundação da Criança da Cidade - Funci
| Ex - Estagiário da Procuradoria Geral do Município
de Fortaleza
"EM VERDADE VOS DIGO QUE,
QUANDO O FIZESTES A UM DESTES MEUS PEQUENINOS IRMÃOS, A MIM O FIZESTES." ( MATEUS 25:40 )
Subscrita por uma plêiade composta de notáveis políticos,
capitaneada por juristas de escol, a Lei 8.069, de 13.07.1990 trouxe ao
universo jurídico o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA vindo, "
ipso facto ", a revogar o vestuto e ultrapassado
Código de Menores de 1979, que, segundo a percuciência sem par de Olympio Sotto Maior, membro da Magistratura de Pé do Estado do
Paraná, "na realidade, em nada contribuía para alterar na essência a
condição de indignidade vividas pelas crianças e adolescentes brasileiros, vez
que sequer os reconhecia como sujeitos dos mais elementares direitos."
Ressalta, ainda, o ilustre representante do "Parquet",
que a justiça de Menores, "colaborava para fomentar a idéia
falsa ( e extremamente perversa ) de serem os
carimbados com o signo da situação irregular responsáveis pela sua própria
marginalidade (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. - Comentários
Jurídicos e Sociais. Coordenadores: Munir Cury, Antonio
Fernando do Amaral e Silva e Emílio Garcia Mendez,
pag. 339, 1992. )
Sob esta epígrafe queremos trazer a colação a pena arguta da
Professora da UFSC, Josiane Rose Petry Veronese:
"Convém recordar que o Código anterior ao Estatuto da
Criança e do Adolescente, o Código de Menores de 1979, fundamentava-se na
doutrina da Situação Irregular isto é, havia um conjunto de regras jurídicas
a um tipo de criança ou adolescente específicos aqueles que estavam inseridos
num quadro de patologia social, elencados no art.2° do referido Código."
( Dra. Josiane Rose Petry
Veronese, Professora da UFSC. “ A CONVENÇÃO
INTERNACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA: TÓPICOS PARA UMA REFLEXÃO. Cadernos de
Direito da Criança e do Adolescente. - 2. ABMP ) |
A própria Declaração de Direitos da Criança já preconizava a
chamada Doutrina de Proteção Integral, hoje alicerçada pelo ECA: "A
criança gozará de uma proteção especial e disporá de oportunidades e serviços,
proporcionados pela lei e por outros meios, para que possa desenvolver-se
física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal
assim como em condições de liberdade e dignidade. A criança deve ser protegida
contra toda a forma de abandono, crueldade e exploração."
A Carta Fundamental de 1988, em seu art. 227 sublinha a política de proteção a criança e ao adolescente. O Estatuto é a nítida
regulamentação deste dispositivo constitucional. Não fugiu, portanto, à
craveira comum da história ao proteger a criança e o
adolescente dos infortúnios da vida tendo como esteio, princípios como da
brevidade, excepcionalidade e respeito a condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, principalmente quando da aplicação de qualquer medida
privativa de liberdade. É o que preceitua, com clareza solar, o art. 227,
&3°,V, da Magna Carta de 1988.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, nos precisos dizeres do
Dr. César de Barros Leal, um dos Ilustres e Competentes Procuradores do Estado
do Ceará, "perfilhou a doutrina de proteção integral, defendida na ONU,
com base em 4 instrumentos de cunho universal: Convenção Internacional das
Nações Unidas sobre os Direitos da Criança; Regras de Beijing (Regras Mínimas
das Nações Unidas para a Administração da justiça de Menores )
Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência
Juvenil; e Regras de Riad (Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos
Menores Privados de Liberdade)."
O mesmo Jurista, passos avante, arrebata os seus doutos ensinamentos de maneira
lapidar: "verbis"
|
Por bem adequadas, vale a pena transcrever as sábias palavras do
Dr. Roberto Reial Linhares: "verbis"
"O Estatuto propiciou uma humanização e uma maior
participação da sociedade na resolução de problemas referentes ao menor
abandonado e criou novos mecanismos e instrumentos para a efetivação do
direito constitucional nesta área, como; os Conselhos da Criança e do
Adolescente a nível Municipal, Estadual e Federal; os fundos de apoio e
justiça da Infância e da juventude." ( Tribuna
do Ceará - Idéias, 04.02.96 - pag. 08 ) |
Entretanto, urge ressaltar que diversos fatores, entre eles a má
divulgação do Estatuto, levaram muitas pessoas a acreditarem, erroneamente, que
existam nas entranhas deste diploma normativo, dispositivos que chancelem a
impunidade dos adolescentes infratores. Suenon Bastos
Mota, Juiz da 2° Vara da Infância e da juventude do Estado do Ceará, clarifica
esta questão quando preleciona que:
" O Estatuto da Criança e do Adolescente não é
condescendente com a criminalidade juvenil; ao contrário impõe, nos casos de
atos infracionais cometidos mediante grave ameaça ou violência à pessoa, a
aplicação da medida sócio educativa de internação. " |
Com bastante proficiência complementa o Culto Magistrado:
"Condescendente é a Lei Penal com relação ao imputável: este comete crime
grave e violento, é processado, julgado a apenado, mas permanecerá solto, por
conta de sua primariedade. O adolescente infrator não; ao receber a aplicação
da medida excepcional de internação, sendo localizado, tem a privação de sua
liberdade com a imediata internação." (jornal
"O Povo,1° Caderno - Opinião - 04.02.96 - pag. 06 )
Dormita na mesma página do matutino retromencionado,
a ensinança da Dra. Neiara
de Morais Bezerra, Advogada do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente -
CEDECA:
"verbis" |
Curial, entretanto, ressaltar que a ordem judicial insculpida nos ditames do
art. 106 do Estatuto da Criança e do Adolescente, deverá ser, devidamente,
fundamentada pela Autoridade Competente, "in casu",
o Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de estar ao arrepio da lei.
Sensível a complexidade e a magnitude do assunto, o Consultor do Fundo das
Nações Unidas para a Infância, Dr. Wanderlino
Nogueira, no Matutino "O POVO", do dia 20 de fevereiro de 1997,
ressaltava que "O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é mais ágil a
mais rígido que o próprio Código Penal."
A contundente opinião do Dr. Wanderlino
Nogueira, leva a pique mais um mito que se desenvolve na sociedade brasileira
de que o ECA é um instrumento de proteção a adolescentes infratores.
Segundo o Consultor, existe muita desinformação sobre a lei e, por conseqüência, muitas interpretações distorcidas.
Já o Dr. José de Farias Tavares, em seus Comentários ao Estatuto
da Criança e do Adolescente, citando o Magistrado a Professor Paulista, Paulo
Lúcio Nogueira, nos fala sobre "a similitude das medidas coativas do
Estatuto com as do Código Penal. Chama a atenção para a forma
"camuflada" com que o Estatuto atribui responsabilidade a adolescente
a partir dos doze anos de idade: sujeito a medidas que são verdadeiras penas,
como a prestação de serviços a comunidade (Estatuto,
art.112. III, e Código Penal, art.46 .)
E conclui com a sabedoria que lhe é peculiar:
"Além dessa medida, que é pena no Código Penal Vigente,
outras há também ( Estatuto Art.112 ) que
correspondem às medidas penais previstas ao condenado maior de dezoito
anos." ( "in Estatuto da Criança e do
Adolescente Comentado, Ed. Saraiva, São Paulo,1991, p122 ) |
Neste instante, trazemos à baila, as palavras da Assistente Social, Dra. Maria Ignês Bierrenbacho, em grandioso
artigo intitulado "A Responsabilidade Criminal do Adolescente:"
"verbis" |
Ultimadas estas breves reflexões sobre o tema jurígeno em pauta,
forçoso é concluir, ante as edificantes argumentações aqui esposadas que o
Estatuto da Criança re do Adolescente - ECA
representa um importante baluarte no que alude a política de atendimento e
proteção a criança e ao adolescente, porque os
enquadra, sem azo a dúvidas, como sujeitos de direito e objetos de absoluta
prioridade.
Segue-se, como é claro a todas as luzes, que a má divulgação do nosso valoroso
Estatuto contribuiu na formação de sofismas acerca de seu real objetivo.
Disse o poeta Fernando Pessoa: "Deus quer, o Homem sonha e a
Obra nasce." .
Pois bem!
Deus quis o Estatuto! O Homem sonhou o Estatuto e a Obra nasceu: eis o Estatuto
da Criança e do Adolescente!